sexta-feira, 23 de maio de 2014

Carlos Herculano Lopes - A Pedra de Lorena‏

A Pedra de Lorena
"Dois homens brancos a encontraram ali, e um deles, de nome Mariano, perdeu-se de amores pela indiazinha"

Carlos Herculano Lopes
Estado de Minas: 23/05/2014

 
Homenagem à indiazinha Raio de Luar, a Pedra de Lorena se destaca na paisagem da cidade de Aimorés, em Minas (Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
Homenagem à indiazinha Raio de Luar, a Pedra de Lorena se destaca na paisagem da cidade de Aimorés, em Minas
 De volta a Aimorés. Depois de quase 10 anos de ausência, estou de novo nessas terras, onde Minas é quase Espírito Santo. Anda-se um pouquinho, e pronto! – chega-se ao Baixo Guandu, já em solo capixaba. Aqui, os dois estados se irmanam. Do calçadão, onde as pessoas fazem caminhadas, contemplo a beleza do pôr do sol que se perde entre as montanhas e também a mítica Pedra de Lorena –  símbolo da cidade. Aimorés, na língua dos botocudos, antigos povos que habitavam a região, vem de guimaré e de aimures, que significam “diferente”.

 O Rio Doce não passa mais na cidade: há alguns anos foi desviado, para se fazer uma hidrelétrica. Onde era seu leito, atualmente, além de um filete d’água, “que quase não dá pra nada”, segundo um morador, só existem fragmentos de rochas, pernilongos, entulhos e solidão. Mas a Pedra da Lorena, imponente e bela, continua no mesmo lugar. De acordo com a lenda (tudo está no livro História de Aimorés, do professor e historiador Antonio Tavares de Paula), nas suas imediações vivia uma tribo dos botocudos, e uma moça linda, Jaci-Reça, ou Raio de Luar.

 Filha do cacique Poton, todas as tardes, antes de começar a noite, ela subia até a pedra, que ainda não se chamava Lorena, e começava a cantar. Até que um dia, por um desses acasos, dois homens brancos a encontraram ali, e um deles, de nome Mariano, perdeu-se de amores pela indiazinha, no que foi correspondido. Mas a menina, à qual ele passou a chamar de Lorena, “um belo nome de mulher entre os brancos”, já estava prometida a Tanuke, filho do cacique de uma tribo vizinha. “Mariano lançou um último e longo olhar dentro dos olhos de Lorena, como que se despedindo não apenas dela, mas da própria vontade de continuar vivendo, e se foi, guiado por um guerreiro”, escreveu o professor Tavares.

Desse dia em diante, a bela Jaci-Reça, ou Raio de Luar, continuou, nos fins de tarde, a subir até ao topo da pedra, como sempre fazia. Só que, perdida de paixão por Mariano, já não cantava mais. Apenas contemplava o horizonte, como se o buscasse nas imensidões do vale. Duas luas depois da partida do amado, do qual já não podia se esquecer, aquela garota, “soltando um grito de desespero a Iara, a senhora das águas, lançou-se nas profundezas do grande rio”. Desde então, nas noites de lua cheia, alguns habitantes de Aimorés, que por acaso se aventuram pelas imediações da Pedra da Lorena, ainda costumam ouvir, tristes e dolentes, os lamentos de Jaci.

P.S.: Agradeço a Pierre Tavares, filho do professor Antonio Tavares, que gentilmente me presenteou com os livros de seu pai.

Nenhum comentário:

Postar um comentário