domingo, 7 de julho de 2013

Dois cafés e a conta com... Betty Faria


PAULO SANT’ANA - A insônia do poeta

ZERO HORA - 07/07/2013

O poeta Luiz de Miranda, morador de POA, manda-me uma mensagem comovente. Ele passa por intransponíveis dificuldades, relacionadas com sua velhice e pobreza.

É de cortar o coração. Sua mensagem para mim é bem curta, por isso vou transcrevê-la, tenho a finalidade de que alguém o ajude, o poder público ou a sociedade.

Eis o apelo lancinante de Luiz de Miranda, que não tem emprego nem aposentadoria:

“Querido Paulo Sant’Ana. Estou vivendo em completa miséria. Vivo há vários anos fazendo uma refeição por dia. Escolhi jantar. Não tenho nenhuma fonte de renda, pois poesia não dá dinheiro. Agora, sou candidato ao Nobel de Literatura 2013, o primeiro gaúcho num Nobel. Estou sofrendo há algum tempo uma ação de despejo, a qualquer momento posso ser colocado na rua.

O prefeito Fortunati ficou de me dar uma pensão mensal, mas se passaram mais de dois anos e nada aconteceu. O governo do Estado nada fez. Tenho problema de saúde: diabetes, pressão alta, insônia crônica. A cada mês, tenho que arrumar dinheiro com meus amigos. Devo ser o único candidato a um Nobel que não tem onde comer e morar. Mando-te o abraço amigo do sul do mundo. (ass.) Luiz de Miranda.”.

Não há poeta no mundo que produza mais textos que Luiz de Miranda, sua capacidade de poetar é admirável, em quantidade ele bate todos os outros poetas. E em qualidade se equipara a muitos deles e supera tantos e tantos.

Não sei, mas imagino o que o poeta está passando, disse-me na mensagem que só faz uma refeição por dia, que está sendo despejado. A vida é mesmo cruel, um poeta semifaminto, ameaçado de ser expulso do lar que mantém a custo, doente, resistindo, resistindo e sempre poetando.

Se fosse moço, teria esperança, mas com 68 anos de idade não compreendo como ainda não lhe faltaram as forças para sobreviver.

Suponho que Luiz de Miranda passa por essa dificuldade física, material e espiritual porque se entregou loucamente à poesia durante toda a sua vida e não teve previdência quanto a seu futuro.

Há poetas, como Miranda, que não se importam com seu destino, querem é dar vazão à sua inspiração. E escrevem, escrevem, cantam como uma cigarra da fábula, sem precaver-se com o inverno.

Tenho esperança que alguém o ajude, o prefeito, os vereadores, os deputados estaduais.

Ele é um conterrâneo que merecia pelo menos um lar decente com duas refeições por dia.

Será que comovo com esta coluna algumas autoridades?

Porto Alegre e o Rio Grande não podem deixar finar-se um poeta sem o nosso auxílio.

Ritmo - Caetano Veloso


O GLOBO

07/07/2013

Decidi aderir à campanha de apoio ao PLS129 porque, engolfado pelo entusiasmo de tantos colegas, percebi que a situação amadurecera muito em muito pouco tempo

Os compositores e cantores que vieram a Brasília para apoiar o PLS 129 estavam muito cheios de vida. De Roberto Carlos a Emicida, de Nando Reis a Gaby Amarantos, de Rogério Flausino a Carlinhos Brown, todos pareciam dotados de uma grande energia, o que para mim era surpreendente. Suponho que é porque eu próprio tenha estado tanto tempo remoendo dúvidas e buscando uma concórdia entre os colegas que sentem a necessidade de questionar o Ecad e os que atuam nas sociedades arrrecadadoras a que ele serve de guarda-chuva. Dias antes, no Rio, Lenine me disse que minha dúvida é que o tinha motivado a agir na direção da aprovação do PLS. Ontem, na sala da presidência do Senado, ele, utilizando a melodia do refrão da irresistível canção de Roberto, liderava o coro: “Esse Ecad sou eu”.

Decidi aderir à campanha porque, engolfado pelo entusiasmo de tantos colegas, percebi que a situação amadurecera muito em muito pouco tempo: insatisfações acumuladas chegaram a um ponto que meus chamados ao diálogo se tornaram irrealistas. Cheguei a conseguir ouvir as duas partes discutindo. Mas a essa altura já estava mais dedicado a entender os motivos dos questionamentos do que a deplorar a discórdia entre amigos criadores. Temos no Brasil uma entidade que, tendo sido criada por lei, detém o monopólio da arrecadação e distribuição de direitos. Essa entidade foi criada juntamente com o Conselho Nacional de Direito Autoral, que a fiscalizava. Este foi extinto (sob Collor) e nada veio ocupar o seu lugar.
Ou seja: há um monopólio sem regulação. Daí, zero transparência. O grande pleito dos autores não é receber mais, é poder saber por que recebem o que recebem — e, mais sério, por que tantos colegas seus não recebem nada. Para mim, esse tema ressurgiu quando, ao receber um manifesto intitulado “Vivo de música” — em que compositores eram convidados a assinar um texto em defesa cega do Ecad, contra a condenação, de parte do Conselho Administrativo de Defesa Econômica, por formação de cartel — senti, sem conversar com ninguém sobre o assunto, que devia esperar, pensar mais, enfim, não assinar automaticamente. Não foi uma intuição sobrenatural. Foi instantânea lembrança de várias conversas mantidas ao longo dos anos. Nesse clima, recebi um e-mail de Fernando Salem com apenas uma pergunta: “Você entende isso?” e a cópia de um artigo de Sérgio Ricardo, dizendo que a suspeita de que a condenação do Ecad pelo Cade fosse do interesse de grandes grupos de mídia não poderia impedi-lo de reafirmar as queixas que ele próprio tinha contra o órgão de arrecadação. E indicava a leitura de um texto de Ivan Lins, em que este dava conta de quanto desaprovava o Ecad em seus modos de operar. Fiquei de orelha em pé.

A ministra Marta pediu ao senador Randolfe (que eu já conhecia da campanha do Freixo e que foi estimulado pelo grupo Fora do Eixo) que contactasse Paula Lavigne. O senador foi a ela com membros do Gap (Leoni, Fernanda Abreu, Tim Rescala, Frejat e outros). Depois recebi Marta no meu camarim em Sampa. Todas as conversas que se seguiram foram muito racionais por parte deles e muito inquietantes para mim: havia colegas nos dois lados. Eu desejava que os dois grupos dialogassem antes de eu me posicionar. E foi isso que escrevi aqui na coluna. O mero fato de eu dizer que não tinha assinado o manifesto e de sugerir tal diálogo fez com que, de um lado, a turma do Gap marcasse encontros para explicar que se tratava de exigir transparência, e, de outro, a turma do Ecad me enviasse e-mails alertando contra o perigo de “estatização” e de “caos”.

Quando fui ao Senado (em cujo plenário ninguém faz silêncio, o que me causou mal-estar) e acompanhei meus amigos num encontro com a presidente Dilma, eu já estava seguro de que não havia risco de “estatização”: os artistas definirão a estrutura do órgão, e a presidente concorda que este tem de ser composto por maioria de autores.

Houve reuniões na casa de Gil e de Paula Lavigne. Chico Buarque, que tinha assinado o manifesto do Ecad, foi a três delas. Pensei que ele fosse ser meu companheiro de dúvidas e exigências intermináveis. Mas ele chegou em casa e pediu que seu nome fosse retirado do manifesto. Daí em diante só vi crescer a vontade de mudança. Djavan mostrou tanto entusiasmo que queria que fôssemos à Cinelândia e fizéssemos um show-protesto. As manifestações de rua ainda não tinham começado. Lenine acha que tem tudo a ver. Há quem tema o contrário. Penso no ritmo das coisas no tempo. Os Racionais MCs tiveram seus créditos retidos pelo Ecad. É hora de mudar.


Eu teria mesmo de vir a Brasília: tenho show marcado aqui hoje. Meu destino eu não traço.