Revista Veja -
24/06/2013
Quando se espalhou por São Paulo um protesto contra o aumento de 20
centavos na passagem de ônibus, todo mundo sentiu que a coisa era bem
maior. Tão maior, mais inebriante, mais mobilizadora, mais assustadora e
mais apaixonante que, em uma semana, multidões bem acima de 1 milhão de
pessoas jorraram Brasil afora na histórica noite de quinta-feira. Todos
os parâmetros comparativos anteriores, como Diretas Já e Fora Collor,
empalideceram diante do abismo aberto entre os representantes dos
poderes, de um lado, e o poder dos que se sentem muito mal
representados, de outro. A presidente acuada, as instituições em estado
de estupor, os políticos desaparecidos e a turbamulta subindo a frágil
passarela do Palácio Itamaraty criaram outro sentimento estarrecedor: é
muito fácil quebrar o vidro que separa a ordem do caos.
Podem-se
passar décadas sem que nada mude, mas uma semana pode concentrar décadas
de mudança. Foi o que se viu no Brasil semana passada. Quem acha que
não mudou passou os últimos dias isolado em uma bolha hemértica.
Curiosamente, aqueles que mais enxergam como agentes da mudança, os
partidos de esquerda, foram os que mais se viram emparedados pela nova
realidade das ruas. O PT acreditava que a paixão dos brasileiros pelo
futebol seria exacerbada pelas Copas, de tal forma que ninguém mais
notaria a corrupção e a ineficiência do governo. Errou feio. Os cartazes
nas ruas fizeram das Copas símbolos odiados dos gasto público de
péssima qualidades, do desvio de dinheiro e do abuso de poder. O pobre
presidente do PT, Rui Falcão, saiu do episódio apelidados de Rui
Falcollor. Em 1992, em gesto de desespero, o então presidente Fernando
Collor convocou os brasileiros a sair às ruas de verde e amarelo. O povo
saiu de preto, e ele saiu do Palácio do Planalto. Falcollor mandou a
militância retomar as ruas das quais os petitas se achavam donos, e viu o
povo cair de pau na hipocrisia. Lula mandou os sindicalistas se
fingirem de povo e o resultado foi o mesmo. Cascudos nos intrusos e
bandeiras queimadas e rasgadas. Os esquerdistas tiveram de ouvir um dos
mais elegantes xingamentos da história mundial das manifestações:
"Oportunistas, oportunistas". Para quem não é do ramo, a frase que abre
este texto é do pai de todas as revoluções, o russo Lênin. Até que
ficaria sem palpite se tivesse presenciado as mudanças dos últimos dias
no Brasil.
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