quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Por que só agora, prefeito? - Andrea Gouvêa Vieira

"Não é sanha arrecadatória e sim questão de justiça fiscal".

Com essa explicação, o prefeito Eduardo Paes expurgou da lista de promessas feitas na campanha eleitoral o compromisso de não aumentar o IPTU.

 O sistema está desorganizado, justificou. Nisso, Paes está certo.
Mas por que só agora, prefeito?

O novo IPTU está pronto. Não foi enviado à Câmara Municipal porque o prefeito temia as eleições. O atual sistema é uma aberração.

Nos últimos 12 anos pagaram IPTU apenas 30% dos imóveis cadastrados — residências, comércio e terrenos. Os outros 70% estão isentos. Seus proprietários sequer recebem o carnê para pagamento. E nessa conta nem entram as favelas, um terço do território do município.

 O vereador Professor Uoston, morador de Ricardo de Albuquerque, por exemplo, está isento, assim como uma colega de gabinete, moradora de uma confortável casa na Vila da Penha. Ambos acham que deveriam pagar!

Toda vez que o assunto veio a público, o prefeito fugiu. Quando cobrei o enfrentamento do problema, ele disse que eu era "republicana demais". Preferiu criar a contribuição de iluminação pública, usando um vereador da base governista como "laranja". Achou que cumpriu a promessa de que não mexeria nos impostos. Nessa campanha repetiu o compromisso. E, reeleito, rompe.

 Existem imóveis isentos de IPTU em toda a cidade — em Copacabana, são 35% dos apartamentos —, mas nas zonas Norte e Oeste a isenção é generalizada. Não por acaso onde o prefeito tem sua maior votação. Quem ousa mexer com dois terços do eleitorado?

 A atual legislação, de dezembro de 1999, é resultado de uma tumultuada aprovação do projeto de lei enviado às pressas à Câmara Municipal, depois que o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional a cobrança de alíquotas de IPTU diferenciadas, caso do Rio. Sem uma nova lei, a Prefeitura não arrecadaria o imposto no ano seguinte.

A proposta faria com que os imóveis mais valorizados tivessem a alíquota reduzida, e os menos valorizados, a alíquota aumentada. Ou seja: rico pagaria menos, classe média mais.

 Na Câmara Municipal o projeto foi emendado de tal maneira, para proteger uns e outros, que, na passagem do ano, um milhão de imóveis dos 1 milhão e 800 mil cadastrados deixaram de contribuir; hoje apenas 40% das residências, 8,7% dos terrenos e metade das salas comerciais recebem o carnê.

Na época, o partido do ex-prefeito Cesar Maia, já na oposição, liderou a batalha contra o novo IPTU. No entanto, ao reassumir a Prefeitura, onde ficou por mais oito anos, não ousou mexer naquele monstrengo, apesar de, já em 2001, a alíquota diferenciada ter sido aprovada pelo Congresso.

Paes adiou a reforma por mais quatro anos, com medo do eleitor.

Mesmo com um imposto capenga, a arrecadação cresceu de cerca de R$ 12 bilhões, em 2009, para R$ 21 bilhões, em 2012. Por que, então, fazer as pessoas pagarem mais?

A questão precisa ser vista de vários ângulos. Um deles é a justiça fiscal.

O Poder Público é obrigado a arrecadar o suficiente para atender às necessidades de todos, de acordo com a possibilidade de cada um. A contribuição de apenas 30% de imóveis é uma distorção.

A questão, portanto, não é pagar mais, e sim ampliar a base dos contribuintes.

Outro ângulo a ser examinado é se a arrecadação é suficiente para os gastos.

A previsão para 2013 é de aumento de 15% dos tributos em relação a 2012. Todos os tributos municipais terão crescimento acima da inflação. Mas as despesas vão consumir rapidamente a receita. Os tributos municipais somados (R$ 8,4 bilhões) serão insuficientes para pagar a folha de pessoal e encargos sociais (R$10,4 bilhões).

As transferências de impostos estaduais e federais (R$ 8 bilhões) equivalem aos gastos com manutenção da máquina pública, pagamento de terceirizados, organizações sociais (R$ 8 bilhões) — um aumento de 24% em relação a 2012. Se comparado a 2008, aumento de 150%!

A pressão por investimentos, para fazer frente a compromissos dos próximos anos, e o crescimento vertiginoso do gasto com a manutenção de novos equipamentos de saúde e educação e com a terceirização crescente dos servidores levam o prefeito a se expor ao risco de quebrar tão rapidamente uma promessa.

Paes reforça a péssima imagem dos políticos junto aos eleitores.
Mas...por que só agora?
É a política, seus tolos!

O GLOBO
18/10/2012 

Entre as brumas do tempo - JORGE FERNÁNDEZ DÍAZ

 Hobsbawm parecia um
paleontólogo diante de um
dinossauro: estava com o
sargento da patrulha que
matara o lugar-tenente de
Mate Cosido, legendário
bandido rural argentino


Contaram-lhes em Resistencia que um lugar-tenente de Mate Cosido — o legendário bandido rural do Norte argentino — havia se apaixonado por uma professora de Misiones. A polícia pressionou a família da moça. Atribulada, ela aceitou convidá-lo para um passeio romântico. O delinquente era procurado, mas não pode resistir — abandonou a clandestinidade e apareceu perfumado em seu automóvel. O plano da polícia era simples: em um lugar pré-determinado, a namorada simularia uma súbita indisposição e pediria para descer do carro.

Aconteceu como planejado. A mulher saiu, se afastou e a polícia apareceu, abrindo fogo. O comparsa do bandoleiro mais famoso do Norte argentino caiu morto. Isso ocorrera no final dos anos 30 e — garantiram aos dois forasteiros — um dos policiais que perseguira o Robin Hood do Chaco estava vivo e aposentado, morando em um sítio nos arredores da cidade de Presidente Roque Sáenz Peña.

Ávidos por história, esses dois forasteiros eram intelectuais que, em 1968, estavam estudando a marginalidade nos confins sul-americanos. Um era José Nun, discípulo de Alain Touraine, companheiro de Fernando Henrique Cardoso. Outro era Eric Hobsbawm, reconhecido como um dos historiadores mais importantes e autor de “História do século XX”.

Nun viajara à Grã-Bretanha para conhecer aquele brillante historiador. Hobsbawm era um homem afável. Aceitara visitar a Argentina.

Pouco tempo depois, Nun levou-o a passear por Buenos Aires e pelos bares, para ouvir jazz. Hobsbawn gostava tanto dessa música que escrevia artigos em um jornal inglês sob o pseudônimo de Frankie Newton. Sob esse nome de ficção estava cifrada uma homenagem ao trompetista de Billie Holiday, que era comunista.

Nessa época, o historiador ainda era um membro do Partido Comunista Britânico. Entre um vinho e outro, Nun fez uma pergunta que soa ingênua até hoje:

— Você acredita que realmente vai viver para ver a revolução marxista na Grã-Bretanha?

Hobsbawm pensou e respondeu:
— Claro que não. Houve um tempo em que eu pensei que a revolução estava ao alcance da mão. Era o fim da Segunda Guerra Mundial. Houve um impressionante nível de solidariedade na sociedade inglesa. Vizinhos lhe chamavam para dizer: “Eu tenho bônus de racionamento de sobra, não quer um?” Em contraste, naqueles anos, os franceses ansiosamente enchiam banheiras com o que rapinavam por aí.

Esse espírito de solidariedade que existia na Inglaterra, e não existe na França, foi perdido. Eu pensei que esse espírito nos levaria ao socialismo. Mas veio o Partido Trabalhista, e mais tarde estávamos de novo no individualismo capitalista.

Bebeu o resto do seu vinho:
— Não, eu não vou ver a revolução. Mas eu tenho que agir como quem acredita que ela virá. Porque essa é a única maneira de acontecer.

Hobsbawm era marxista e pagou por isso durante a Guerra Fria. E também pagou quando criticou duramente o regime stalinista e renunciou à doutrina do marxismo-leninismo.

Finalmente, viajaram juntos para Resistencia, para começar seu estudo de campo. Nun tinha lido outro clássico de Hobsbawm: “Rebeldes primitivos”. Nesse livro, o historiador analisou quatro rebeldes pré-capitalismo: o ladrão nobre (um Robin Hood, que roubava dos ricos para dar aos pobres), o vingador (como os cangaceiros brasileiros do século XIX), os guerrilheiros húngaros (formação paradigmática da luta contra o opressor estrangeiro) e bandidos expropriadores (próximos do anarquismo).

Nun percebeu que a história de Mate Cosido não passaria indiferente ao seu companheiro de viagem. O bandoleiro famoso, que na Argentina foi lindamente estudado por Hugo Chumbita, se chamava David Segundo Peralta. O apelido tinha origem numa cicatriz em sua cabeça. Autodenominado “o vilão dos pobres”, amado pela população local, era famoso na região por roubos a propriedades da Bunge & Born, Dreyfuss e Anderson, Clayton & Co. e La Floresta, e por sua associação com o outro Robin Hood dos pampas: Juan Bautista Vairoleto.

A notícia de que havia um sobrevivente da patrulha fascinara Hobsbawm. Em Presidente Roque Sáenz
Peña encontraram o sobrevivente da patrulha que matara o lugar-tenente de Mate Cosido. Era um sargento chamado Avalos. Em torno de um mate, conversaram.

A certa altura, Hobsbawm disse: “Espere, espere, deixe-me adivinhar.” E tomou a narrar em detalhes como eles se organizaram e como eles se moviam. O sargento abriu o olhos, não podia acreditar: a história do bando havia tinha chegado a Londres? “Não”, respondeu o historiador. “O que estou descrevendo é a forma como operavam bandidos sociais na Itália durante o século passado.”

Depois de anos em arquivos e diante da vida real, parecia um paleontólogo em contato com um dinossauro. Sua teoria até então explicava o surgimento desses bandidos como resultado de um confronto entre o capitalismo nascente e comunidades tradicionais que foram subjugados. A experiência da Argentina levou-o a reescrever esta teoria em outro famoso artigo acadêmico, publicado em 1972, no qual aceita o tipo híbrido entre ladrão “nobre” e a filiação de viés anarquista que Mate Cosido e Vairoleto demonstravam com orgulho.

Hobsbawm tornou-se leitor de Borges e voltou a Buenos Aires por duas vezes. Procurava Nun em jantares, discutiram a política e a vida. Há duas semanas, Nun soube que Hobsbawm morrera, aos 95 anos. “Me deu uma pena, uma grande pena” — disse-me Nun. “Te conto tudo isso para que não se perca nas brumas do tempo.”

Jorge Fernández Díaz é colunista do jornal “La Nación” (Argentina)/ GDA

O GLOBO
18/10/2012

Democratas em busca de Salvador - Raquel Ulhôa

O presidente nacional do Democratas, antigo PFL, senador José Agripino (RN), bateu na porta de 33 empresários de São Paulo em busca de ajuda financeira para as campanhas dos candidatos do partido a prefeito de várias cidades. Apenas um deles negou, justificando que nestas eleições não contribuiria com nenhum partido. Dos demais, o dirigente recebeu dinheiro para distribuir às campanhas. Como contrapartida, alguns deles fizeram um pedido: que o DEM seja mais afirmativo na oposição ao governo petista e na defesa do ideário liberal.
Agripino sentiu-se estimulado pelo interesse do setor produtivo em fortalecer o contraponto à hegemonia do PT no país. Empenhado na tarefa de tentar evitar o desaparecimento do DEM, ou sua fusão com outra legenda, o senador argumentou com os empresários que, para que o DEM tenha legitimidade para falar e ser ouvido, precisa de respaldo das urnas. Sem isso, o partido não ganha respeitabilidade. Na atual campanha eleitoral, isso significa vencer a disputa pela Prefeitura de Salvador.
Ganhar a capital baiana, terceira maior cidade do país, significaria agregar 1,8 milhão de eleitores e dar ao Democratas uma vitrine administrativa. Se o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM), o ACM Neto, for vitorioso e fizer uma boa gestão, pode garantir sobrevida ao partido, cuja sobrevivência está ameaçada pela perda de quadros e sucessivos escândalos que abateram lideranças expressivas.
Ganhar capital baiana pode dar sobrevida a DEM
Parte da cúpula demista, com Agripino à frente, busca discurso para rebater a tese da fusão. A avaliação desse grupo é que, unir-se ao PMDB significaria tirar dos demistas a característica de oposição - o que é bom para alguns e ruim para outros. Resultaria em uma "cobra de duas cabeças", dizem. Já uma fusão com o PSDB representaria, para o DEM, ser "engolido" ou "sugado" pelo atual parceiro de oposição, que não costuma ser generoso nos acordos eleitorais locais.
Uma das feridas deixadas pela atual eleição municipal foi aberta na disputa pela Prefeitura de Fortaleza (CE), onde o PSDB de Tasso Jereissati não apoiou Moroni Torgan (DEM), que começou a campanha liderando a disputa. Os tucanos não tinham candidatura considerada competitiva. Torgan acabou em terceiro lugar e não foi para o segundo turno.
A eleição de Fortaleza pode abrir um novo cenário para o DEM em 2014, se o partido conseguir sobreviver até lá. Na última terça-feira, Agripino recebeu em seu gabinete o ex-deputado Ciro Gomes (PSB), ex-ministro de Lula e irmão do governador do Ceará, Cid Gomes (PSB). Com a participação de Moroni Torgan, Agripino e Ciro fizeram acordo para o DEM apoiar o candidato do PSB, Roberto Cláudio, que disputa com Elmano de Freitas, do PT. Em troca, Torgan pode ganhar espaço no governo do Estado.
A disputa é local, mas o DEM está de olho nas possibilidades de aliança em 2014. Agripino deixa claro que não haveria incoerência política em uma aliança com o PSB para o Palácio do Planalto, com o objetivo de reforçar um projeto de poder alternativo ao do PT. O dirigente demista diz que, se for procurado pelo presidente do PSB, Eduardo Campos, governador de Pernambuco, está aberto à conversa.
"O Democratas tem uma postura ideológica clara, na defesa da livre iniciativa, na luta contra a carga de impostos e na defesa do setor primário. Nós trombamos com o PT em muita coisa. Com o PSB, não. Os princípios do governo do Eduardo Campos em Pernambuco e do Cid Gomes no Ceará em nada conflitam conosco. Não há o impeditivo ideológico na forma de governar", diz o presidente do DEM.
À procura de um discurso que evite o desaparecimento da sigla, o comando do partido busca justificativa para comemorar o desempenho nas eleições municipais. Até agora, elegeu 276 prefeitos, menos do que os 340 que tem hoje. O partido atualmente não comanda nenhuma capital e agora ganhou Aracaju (SE) e espera conquistar Salvador.
Além disso, o partido sofreu forte redução depois das eleições de 2008, com a criação do PSD de Gilberto Kassab, que saiu das eleições municipais como a quarta força política, com a eleição de 494 prefeitos. Com a criação da legenda de Kassab, o DEM perdeu quase um terço dos deputados federais, um governador e a Prefeitura de São Paulo.
Houve, também, escândalos de corrupção que abateram lideranças expressivas do partido, como o ex-governador José Roberto Arruda (DF) e o ex-senador Demóstenes Torres (GO).
Os dirigentes do DEM consideram positivo o fato de, apesar desses problemas e de estar afastado do poder federal há dez anos, o partido ter ficado em oitavo lugar no ranking do eleitorado conquistado (4,7 milhões), atrás de PMDB, PT, PSDB, PSB, PSD, PP e PDT. O DEM conquistou a capital de Sergipe, espera vencer em Salvador, ganhou cidades importantes em seus Estados, como Feira de Santa (BA), Barueri (SP) e Mossoró (RN), e tem boas chances em Vila Velha (ES), maior colégio eleitoral do Espírito Santo.
Apesar de enfrentar a trinca petista formada pela presidente Dilma Rousseff, pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pelo governador Jaques Wagner (BA), todos em torno de Nelson Pelegrino (PT), ACM Neto terminou o primeiro turno com uma pequena vantagem sobre o petista. Lula participou de evento da campanha e Dilma gravou para a propaganda eleitoral do rádio e da televisão. No segundo turno, Salvador é uma das prioridades para a presidente visitar. ACM Neto é desafeto pessoal de Lula, desde que, da tribuna da Câmara dos Deputados, disse que daria uma surra no então presidente.
Sem máquina administrativa para ajudá-lo, ACM Neto conta com a aglutinação das forças políticas que se opõem ao PT no Estado, que reúnem ex-carlistas e ex-adversários do grupo de ACM - como o tucano Jutahy Júnior e o pemedebista Geddel Vieira Lima - e com a herança do avô ACM, para o bem e para o mal. Se ganhar, pode dar sobrevida ao DEM. Uma derrota poderá ser a pá de cal na tentativa de manter o DEM vivo.
VALOR ECONÔMICO
18/10/2012 

PAULO SANT’ANA - Eu é que entendo de goleiro

Meus amigos, peço que não discutam mais futebol comigo. Quando eu disser que um jogador não joga nada, é porque ele não joga nada.

Quando eu disser que um goleiro é frangueiro, baixem a cabeça e silenciem. Não me contestem, quem entende de goleiro sou eu. Eu não sei mais futebol do que os outros por ser mais inteligente do que eles, eu sei mais futebol do que os outros todos porque sou mais velho do que eles, tenho mais experiência.

E de goleiro eu entendo. Peço que não discutam mais goleiro comigo porque eu sou soberano nesse aspecto.

O mensalão foi coisa de R$ 500 milhões. Ocorre, no entanto, que paralelamente ao mensalão correm um processo e uma CPI contra Carlos Cachoeira. E um deputado que é membro da CPI declarou anteontem que os negócios ilícitos que rondam as atividades em torno de Cachoeira andam no montante de R$ 82 bilhões.

É muito dinheiro. Por isso Carlos Cachoeira tinha até a seu serviço o ex-senador Demóstenes Torres, cassado depois de deixar o DEM.

Já a Justiça recusou vários habeas corpus que visavam a libertar Cachoeira.

E a empreiteira que estava por trás de Carlos Cachoeira é a Delta, uma das mais bem aquinhoadas com verbas do governo.

É muito dinheiro público empregado em corrupção. É um oceano de dinheiro e um mar de corrupção.

A gente vive intensamente sob pressão. Atualmente estou sofrendo duas cargas de pressão muito grandes.

Em primeiro lugar, é o número infindável de leitores que me pedem, me imploram para que eu pare de fumar.

E eu não tenho forças para atendê-los. Podem até dizer, que eu não fico brabo: não tenho coragem para atendê-los e deixar de fumar. Sou um covarde, bem sei.

A segunda grande carga de pressão que tenho sofrido é de muitos que me pedem para optar publicamente por candidaturas à presidência do Grêmio.

Os solicitantes dizem que, se eu optar publicamente nesta coluna por uma candidatura, ela será a vencedora. Eu sei disso, talvez seja por isso até que eu não opto, achando que não seria justo e se tornaria altamente desequilibrador que eu me tornasse cabo eleitoral de um dos candidatos: a campanha perderia a alteridade.

Há adeptos de uma candidatura que se constituem em 70% dos que me fazem esse apelo. Portanto, os partidários da outra candidatura se constituem em 30%.

Quero crer que os 70% são os que estão desesperados, achando que vão perder a eleição.

Que posso fazer? Gostaria de meter meu bedelho, mas não posso.

Seja Odone o eleito, seja Koff, o que eu imploraria a ele é que faça o Grêmio voltar aos títulos nos campeonatos.

Que o eleito torne imediatamente o Grêmio grande como já o foi no passado.

A torcida já não suporta mais a ausência de títulos. Já não dá mais para aguentar.

ZERO HORA
18/10/2012 

Na feira, entre paixão e mangás - Marina Colasanti‏




Frankfurt – Atravessando a ponte de ferro que cruza o Rio Meno, um modismo chama a minha atenção. São centenas de cadeados, com e sem corrente, solitários ou em cachos, presos nos balaustres de ferro. Todos os cadeados têm nomes gravados. São namorados ou amigos ou grupos de trabalho que testam sua ligação prendendo-a dessa maneira simbólica. A graça será voltar e verificar se amor e amizade sobreviveram em liberdade, ou se apenas se mantêm juntos quando retidos por uma chave.

Na Feira de Frankfurt, não precisamos de teste, estamos todos presos ao livro por uma paixão que nada desata. Não é uma feira aberta ao público. Durante toda a semana, somente profissionais circulam neste elegante mercado persa de leitura feito de espaços enormes, escadas rolantes e esteiras, onde, ao redor de mesinhas discretas, nos estandes e nos pavilhões, se negocia a palavra impressa e agora também a virtual. É uma multidão aparentemente silenciosa essa que se movimenta apressada, levando pastas e bolsas cheias de livros, com passos abafados pelos carpetes. De tantos encontros, tantas conversas, quase nada se ouve. De vez em quando, uma aglomeração em frente a algum estande ou pavilhão, é um coquetel ou uma leitura, é uma filmagem ou entrevista para a televisão, um pulsar de trabalho que ainda assim se mantém discreto. 

Mas essa discrição toda desaparece ao fim da semana profissional, quando os editores já se foram e a feira é aberta ao público. O silêncio de que os alemães tanto gostam dá lugar a uma espécie de Japão delirante, pois já há alguns anos tornou-se moda entre os jovens ir fantasiado de personagem de mangá. Cruzei com uma moça pálida que carregava nos braços um falso cadáver, me vi espremida entre três jovens vestidas de bonecas e um homem com asas abertas feitas de facas luminosas, quase pisei na cauda de um dragão, esbarrei em vários samurais. Como em uma festa à fantasia, vai-se para ver e ser visto, para fotografar e ser fotografado, para comer nas inúmeras lanchonetes e nas barracas ao ar livre, e, se possível, para surpreender. Os livros diante dos quais as pessoas se apinham não estão à venda.

Desse universo múltiplo, o Brasil será rei no próximo ano. Como um cetro, o cilindro transparente que contém o compromisso nos foi passado pela Nova Zelândia durante a comovente cerimônia de encerramento. Na escuridão de um espaço sem limites, em que espelhos de água refletiam as luzes salpicadas no alto como estrelas, os maori despediram-se com cantos indígenas. E o Brasil assumiu, com um tocar de violão.

Deveremos nos sentir bem, nessa Frankfurt que pretendemos invadir culturalmente. Centro financeiro mais importante do país, ninho dos grandes bancos, não parece exibi-lo. O Rio Meno a atravessa com a mesma serenidade com que fluía no século 1, quando a cidade foi fundada pelos romanos. Os espigões modernos são pontos de exclamação na paisagem urbana, os plátanos sombreiam as ciclovias e avenidas. 

Do lado de fora da feira há uma enorme escultura, um homem de ferro que levanta o braço direito e martela, e torna a levantá-lo e martela, em interminável repetição do mesmo gesto. É o Trabalhador. Olhando para ele, imaginei-o no ano que vem, folheando um livro repetidamente. Um livro brasileiro.
 
ESTADO DE MINAS
18/10/2012 

Tereza Cruvinel - A batalha do setor elétrico

Todos queremos a redução das tarifas de energia, mas essa proposta foi apresentada às vésperas das eleições, com oportunismo 



Está começando mais uma disputa entre o PT e o PSDB, agora na arena parlamentar, em torno da Medida Provisória nº 579, a chamada MP do Setor Elétrico, editada pela presidente Dilma há um mês, com a promessa de redução das tarifas de energia em 16% para os consumidores residenciais e de até 28% para as empresas. A comissão mista foi instalada ontem, tendo como presidente o líder petista Jilmar Tatto (SP) e como relator o senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Começará efetivamente a trabalhar no dia 31. Mas num sinal do baixo consenso existente no Congresso sobre o assunto, 431 emendas já haviam sido apresentadas ontem, indicando que sua aprovação será um parto difícil, exigindo negociações e talvez concessões do governo para fazer valer sua vasta maioria. O PSDB já deixou claro que esticará a corda o quanto puder, e os petistas que vão topar a briga. Além de colocarem o próprio líder na presidência da comissão, escalaram para integrá-la dois soldados da artilharia, Weliton Prado (MG) e Fernando Ferro (PE), que é engenheiro. O PSDB também indicou um especialista, Antonio Imbassahy (BA).

A consequência mais grave da oposição tucana à medida traduz-se na resistência das três usinas da Cemig em aceitar a renovação das concessões nos termos propostos pela MP: com a supressão das amortizações de investimentos, que para o governo já teriam ocorrido (resíduos seriam quitados antecipadamente), e a adoção da nova regra tarifária.

“Não vamos admitir que uma medida fundamental para o crescimento e de interesse da população seja inviabilizada ou desfigurada pelos propósitos políticos do PSDB”, diz Prado, apontando algumas das emendas tucanas apresentadas.

Uma delas, a 287, do deputado Alfredo Kaiser (PR), na prática inviabilizaria a existência da tarifa social para os mais pobres, na medida em que destina ao ressarcimento das perdas do estados com ICMS os recursos da conta que hoje banca esse subsídio.

Imbassahy, pelo PSDB, diz que o governo está na direção certa mas que a MP foi fechada de modo apressado, deixando de ouvir segmentos importantes, como os chamados consumidores livres, entre os quais as grandes indústrias de consumo variável. Tanto é que, diz ele, teria havido divergências entre a Aneel e o Ministério das Minas e Energia sobre a edição. “Achamos que faltou debate e sobrou rigidez. Todos queremos a redução das tarifas mas essa proposta foi apresentada às vésperas das eleições, com oportunismo. Existe incerteza e insegurança dos investidores. A redução das tarifas pode não acontecer da maneira como a presidente anunciou”, diz ele.

O prazo para as concessionárias entregarem a documentação aceitando a renovação dos contratos em novas bases terminou na terça-feira, mas 14 de 123 usinas não apresentaram a documentação. “O governo fará novas licitações para aquelas que não aceitarem a renovação. E vamos mobilizar a população em defesa desta medida de interesse popular”, diz Weliton Prado.

O cabo de guerra está armado. E nós, consumidores, estamos no meio. Nem Dilma, nem Joaquim

Integrantes de um movimento da sociedade civil pela reforma política estiveram na Câmara pedindo aos senhores deputados que coloquem o assunto em pauta. São ecos do julgamento do STF. O presidente da Câmara, Marco Maia, assegura que, depois do segundo turno, a comissão mista encarregada do assunto voltará a debater a proposta do relator Henrique Fontana (PT-RS).

“Vi o ministro Joaquim Barbosa dizer que vai procurar a presidente Dilma para tratar do assunto. Talvez ele não saiba, mas isso não compete nem a ele nem à presidente. É tarefa nossa, e temos aprovado reformas políticas pontuais com frequência. Depois do segundo turno, talvez possamos aprovar pontos mais complexos, como o financiamento público de campanhas e a coincidência das eleições”, disse Maia ontem. 
Guardanapo e iogurte

A disputa da presidência da Câmara vai se armando. Além de Julio Delgado, do PSB mineiro, outro que tem anunciado disposição para ser candidato avulso contra Henrique Eduardo Alves, do PMDB, é Inocêncio Oliveira, do PR. Mas todo mundo na Casa acha que ele busca cacife para negociar um outro cargo na Mesa. Há algumas décadas Inocêncio está sempre na Mesa. “Por isso é que o apelidaram de guardanapo”, conta Marco Maia. No PT, começa uma disputa entre Paulo Teixeira (SP) e André Vargas (PR) pela vice-presidência. “Vocês sabem. No PT, nada é natural. Nem iogurte”, diz ainda o sardônico Maia.

ESTADO DE MINAS
18/10/2012 

CIÊNCIA » Lua, um pedaço da Terra‏

Cientistas do Reino Unido e dos EUA concluem que o satélite natural é uma parte que se desprendeu de nosso planeta, depois do choque com um asteroide. Estudo derruba teoria de cinco décadas 
 

Max Milliano Melo



A Lua, nosso vizinho mais próximo, é motivo de culto em algumas culturas, influencia as marés e simboliza o amor romântico. O fascínio do homem pelo único satélite natural da Terra vem fazendo com que a origem da bola rochosa seja um dos principais enigmas da astronomia. Em um conjunto de artigos publicados nas edições de hoje das duas principais revistas científicas do mundo, a Nature e a Science, um grupo de pesquisadores britânicos e norte-americanos anunciou uma reviravolta na principal teoria sobre o surgimento do astro. Segundo as novas pesquisas, a Lua é um pedaço da Terra, desprendido depois de uma colisão gigante há bilhões de anos.

Os pesquisadores já sabiam que a Lua teria sido formada depois da queda de algum astro na Terra. No entanto, de acordo com a principal teoria vigente desde a década de 1960, uma rocha derretida do asteroide Theia teria dado origem ao satélite. “O objeto que colidiu com o pVlaneta teria sido gigantesco, do tamanho de Marte e com uma massa equivalente a 10% da Terra”, explica Frederic Moynier, cientista da Universidade de Washington e um dos líderes do estudo. A proposta se tornou a mais aceita pela comunidade científica desde a invenção dos computadores modernos. Capazes de cálculos complexos, eles mostraram que, matematicamente, seria possível que o choque criasse a Lua. Tal teoria passou a ser chamada de Big Splash (veja arte).

Esse modelo, no entanto, passou a ser colocado em xeque já no início da década de 1970, quando as primeiras amostras da Lua chegaram à Terra, trazida pelas cápsulas das missões Apollo, que visitaram o satélite, entre 1969 e 1971. Análises químicas feitas nas rochas lunares mostraram que a composição química do satélite era parecida com a da Terra. O impasse permaneceu durante quase quatro décadas. Até que, mais uma vez, o desenvolvimento de instrumentos de análises mais detalhadas permitiu aos cientistas compreenderem a estrutura química lunar. “Nós ainda trabalhamos em rochas coletadas pelas missões Apollo, porém, hoje, temos os tipos mais modernos de instrumento para medir a abundância química com uma precisão muito elevada”, explica Moynier.

Foi o elemento zinco, farto tanto na Terra quanto na Lua, que serviu de guia para os pesquisadores. “Usamos um instrumento chamado espectrômetro de massa com fonte de plasma para medir a abundância de diferentes formas do elemento zinco”, conta o especialista norte-americano. Os isótopos do elemento encontrados na Lua são de um tipo semelhante ao existente na Terra, o que reforçaria a ideia de que o satélite é um pedaço desgarrado de nosso planeta. “ O zinco lunar que encontramos é diferente do zinco terrestre. Essa diferença deve ter se originado em um evento evaporativo gigantesco, muito provavelmente o imenso impacto que deu origem à Lua”, explica.

Condensação No momento do choque, uma grande quantidade de rocha terrestre derretida teria sido lançada para fora da Terra, não se distanciando do planeta graças à força da gravidade. Segundo a nova tese, os isótopos mais densos de zinco se condensaram mais rapidamente, em comparação com as variantes mais leves do elemento. Assim, ao contrário do que se imaginava, não teria sido um processo de vulcanismo o responsável pela presença do zinco lunar, mas uma grande evaporação, ocorrida durante o resfriamento do material terrestre.

Mas o que teria ocorrido com o grande corpo que se chocou com a Terra e causou a explosão? Os cientistas também têm uma teoria para isso: a energia liberada no choque entre o nosso planeta e o asteroide foi capaz de derreter o material que o compunha, depositando a maioria dos resíduos no planeta. Apenas os silicatos mais leves teriam entrado em órbita. Mais tarde, foram acrescidos de outras substâncias vaporizadas, atuando no processo de formação do satélite natural terrestre.

Descoberto um “astro irmão” 


Um grupo de astrônomos da Universidade do Porto, em Portugal, anunciou na edição de hoje da revista Nature, ter encontrado um planeta bastante especial. Na constelação Alpha Centauri B, localizada a apenas 4,3 anos-luz da Terra — um distância bastante pequena, se considerada a escala espacial —, existe um planeta de massa muito similar à da Terra. 

As semelhanças com nosso planeta não param por aí. O astro orbitaria uma estrela com dimensões e idade parecidas às do nosso Sol. Trata-se da primeira vez que uma dupla tão parecida com o Sol e com a Terra são localizados juntos. A proximidade e as característica dele permitem, que no futuro, sondas espaciais possam ser enviadas ao planeta, até agora o mais parecido com o nosso a ser localizado em regiões próximas.

Os especialistas do Observatório de Genebra, na Suíça, e do Centro de Astrofísica da Universidade do Porto, em Portugal, utilizaram um instrumento chamado Harps para visualizar o corpo. O equipamento está instalado no complexo do Observatório Europeu do Sul (ESO), no norte do Chile, o mais potente observatório espacial já construído.

Antes de os entusiastas da vida alienígena começarem a tentar contato com a “nova Terra”, os cientistas mandam um aviso. O planeta está fora da chamada zona habitável — a região distante da estrela onde a temperatura é alta o suficiente para que exista água sob a forma líquida, mas não tão grande para que ela evapore completamente, impedindo o estabelecimento de alguma forma viva. Em resumo: o planeta é um grande deserto rochoso.
 
ESTADO DE MINAS
18/10/2012 

Memória perdida pelo AVC volta com malhação - Marcela Ulhoa‏

Treinos aeróbicos e de resistência muscular podem, em seis meses, reduzir problemas cognitivos de pacientes que sofreram derrame cerebral 
 

Marcela Ulhoa



O derrame cerebral, nome popular do acidente vascular cerebral (AVC), ocorre subitamente em qualquer idade, sexo ou classe social. Ele é a segunda causa de morte no mundo, responsável por 6 milhões de óbitos a cada ano, e a principal causa de incapacitação devido às sequelas. Problemas cognitivos, como perda de memória e dificuldade de concentração, estão entres as consequências do mal. Desconfortos que, segundo pesquisadores da Universidade de Toronto, no Canadá, podem ser amenizados pela prática de exercícios físicos. 
 
Seis meses de treino aeróbico aliado a atividades de resistência podem melhorar em até 50% dos casos os problemas cognitivos depois do derrame. A atividade física já era conhecida como uma importante aliada na recuperação das funções motoras, também comprometidas pelo AVC, mas é a primeira vez que são estudados os benefícios para o cérebro. De acordo com a médica Susan Marzolin, autora do artigo, o comprometimento cognitivo leve ocorre em até 64% das pessoas que sofrem um derrame e pode aumentar em três vezes o risco de mortalidade depois do problema vascular. “Ele também é associado ao aumento das taxas de institucionalização dos pacientes e à diminuição das atividades funcionais diárias. Além disso, o comprometimento cognitivo aumenta o risco do desenvolvimento de demência”, explica Susan.
 
O que a pesquisadora defende é que levantar peso não só melhora a força muscular, assim como caminhar não ajuda apenas no condicionamento cardiorrespiratório. As duas atividades, quando realizadas em conjunto e com frequência, podem também incentivar a neurogênese dos pacientes que sofreram um AVC. Além disso, ela acrescenta que evidências recentes relacionam a atrofia cerebral e o pobre desempenho cognitivo ao aumento da massa gorda em pessoas com início de Alzheimer. 
 
De acordo com a neurologista Letícia Costa Rebello, da Academia Brasileira de Neurologia (ABN), o estudo canadense traz uma nova e importante perspectiva, já que as pesquisas com foco na relação entre exercício e a melhora cognitiva ainda são muito novas e experimentais. “São teorias, hipóteses. Acredita-se que o exercício melhora a oxigenação cerebral e facilita a neurogênese, mas nada é muito tachado.” 
 
A neurologista explica que, quando uma pessoa sofre um AVC, algumas áreas do cérebro ficam inativas. “Aquele pedaço em que ocorreu o derrame fica morto e perde as funções. A partir do momento em que isso ocorre, surge a necessidade de ativar áreas próximas e que possam dar conta das funções do tecido perdido”, ressalta. Os exercícios físicos, nesse sentido, funcionariam como estímulos nessas outras regiões, pois seriam capazes de facilitar o surgimento de novos neurônios.

Campanha Neste ano, a importância da reabilitação de pacientes que sofreram um derrame ganhou destaque especial. O Congresso Internacional de AVC, organizado pela World Stroke Organization (WSO), ocorrido esta semana, teve como lema Eu me importo. Além de focar na educação sobre fatores de risco, sinais de alerta e a urgência do tratamento do AVC, a campanha de 2012 enfatiza a importância do cuidado, depois do derrame, por parte da família, dos cuidadores e das associações de suporte aos pacientes.
 
“A pessoa que tem um AVC vai apresentar um déficit específico, pode ser visual, na fala, motor ou cognitivo. Ela está em uma idade produtiva, trabalhando, mantendo uma família e, de uma hora para outra, fica incapaz de realizar essas mesmas tarefas. Isso é um impacto absurdo na vida dela e na da família”, enfatiza Letícia Rebello.
 
Maria da Graça Silveira e seu marido, Francisco de Assis Linhares, conhecem bem as dificuldades da adaptação. A dona de casa de 62 anos se tratava contra um câncer descoberto no ano passado, quando teve um AVC. “Ela estava respondendo bem à quimioterapia, mas teve um derrame durante esse período. Depois, me aposentei para cuidar dela”, conta Francisco, de 64, que trabalhava como médico intensivista.
 
Atencioso, Francisco acompanha a mulher todos os dias na clínica de reabilitação e comemora a rápida melhora. Depois de dois meses de tratamento, Maria da Graça já consegue movimentar a perna esquerda e, em pouco tempo, deve sair da cadeira de rodas. Os exercícios aeróbicos começaram a ser feitos. No futuro, virão os de resistência muscular. A meta da equipe médica que atende Maria da Graça é fazer com ela esteja caminhando livremente dentro de duas semanas. Depois disso, o foco será a recuperação do movimento de seu braço esquerdo.

Momento certo
 Membro da equipe de médicos responsável pela reabilitação de Maria da Graça, Carlos Gropen, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (UnB), ressalta a importância de definir o momento certo para a realização de exercícios em pacientes com AVC em processo de reabilitação. “Se você coloca o paciente antes do tempo para fazer um exercício muito pesado, pode forçar as articulações do joelho dele, por exemplo. Ele começa a andar, mas logo vai parar de novo porque estará lesionado. Precisamos trabalhar juntos, com um grupo formado por fisioterapeutas, médicos, fonoaudiólogos, psicólogos.” 
 
Gropen reforça ainda que é importante desmistificar a ideia de que há o tempo máximo de um ano para que as funções perdidas pelo AVC possam ser recuperadas. “Já existem casos comprovados na literatura de pessoas que recuperaram movimento depois de sete, oito anos”, diz. O médico reforça a importância de incentivar os pacientes e mostrar a eles que é possível ter qualidade de vida mesmo após um AVC.

Marido e marido. Mulher e mulher - Flávia Ayer e Paula Sarapu‏

Novos dados do IBGE mostram que minas, conhecida por ser tradicional, é o terceiro estado com mais homossexuais vivendo juntos. Tiradentes e duas cidades da Zona da Mata estão entre as cinco do país com maior percentual de gays sob o mesmo teto 
 

Flávia Ayer e Paula Sarapu


Apesar da fama de tradicional, Minas Gerais é o terceiro estado onde há maior concentração de casais gays morando sob o mesmo teto, atrás apenas de São Paulo e Rio de Janeiro. A constatação vem de dados do Censo 2010, divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pela primeira vez, o órgão investigou a fundo famílias formadas por homossexuais e identificou que, do total de 67,4 mil casais gays que vivem juntos no país, 4,9 mil (7,3%) moram em Minas, que ainda figura no topo de outro ranking: Tiradentes, nos Campos das Vertentes, e Rodeiro e Pequeri, na Zona da Mata, estão entre as cinco cidades brasileiras onde há, proporcionalmente, mais gays que decidiram juntar as escovas de dente. 

O Censo 2010 mostrou também que a maioria quase absoluta dessa população vivia em união consensual. Mais da metade desses casais se encontrava na Região Sudeste e que um quarto dos casados com pessoas do mesmo sexo tem nível superior completo. A maioria dos homossexuais entrevistados se declarou católica (47,4%), seguida por pessoas sem religião (20,4%). 

Apesar da vida a dois assumida por homossexuais, Minas mantém comportamentos conservadores e, 10 anos depois do último Censo, continua com o menor percentual do país de casais vivendo em união consensual, 25,9%. O número, entretanto, representa um salto significativo, se considerado que, em 2000, apenas 18,8% dos casados em Minas viviam em união consensual, mas está longe de alcançar os 36,4% no Brasil em 2010.

De acordo com a demógrafa do IBGE Luciene Longo, Minas é um estado onde a força da religião e dos costumes se mantém, mas, por ser o segundo estado mais populoso, acaba tendo peso maior na ruptura dessas tradições, caso das uniões homoafetivas. “Como Minas tem uma população grande, com mais de 19 milhões de habitantes, é natural que tenha número maior de casais de homossexuais”, afirma Luciene.

Traços mais liberais estão presentes em municípios do interior, figuram no topo do ranking das cidades com maior concentração de casais homossexuais vivendo sob o mesmo teto, em relação ao total da população. Com 6,9 mil habitantes, Tiradentes, a 190 quilômetros da capital, é a terceira na lista, atrás apenas de Águas de São Pedro e São João de Iracema, ambas em São Paulo. A cidade histórica é seguida por Pequeri, com 3,1 mil moradores, e Rodeiro, com 6,8 mil pessoas. 

Enquanto a média nacional é de 0,03% dos cônjuges morando com pessoas do mesmo sexo, Tiradentes, Pequeri e Rodeiro têm percentual de 0,14%, 0,13% e 0,12%, respectivamente. “Primeiramente, há de se considerar que tratamos de números pequenos. Apesar disso, observamos que todas as cidades estão próximas do Rio de Janeiro, um estado mais liberal”, avalia Luciene.

O jovem tiradentino Rodrigo Giovani dos Santos, de 27 anos, ilustra bem essa estatística. Ele mantém união estável com o contador Igor Vanucci Gonçalvez Jacques, de 26, que há dois anos se mudou para a cidade histórica, onde os dois vivem juntos. Rodrigo trabalha numa pousada e acredita que a diversidade de frequentadores de Tiradentes estimula um perfil mais liberal. “Apesar de ser uma cidade religiosa, não há preconceito. Minha família também tem princípios bem mineiros, do interior mesmo, mas recebeu o Igor muito bem”, conta Rodrigo, que é católico e quer passar a união estável para casamento, para adotar uma criança. 

Segundo o rapaz, Tiradentes recebe bem os casais homoafetivos. “Nossa cidade é muito tranquila e o número de gays vem aumentando nos últimos anos. Creio que eles se sentem bem por aqui”, diz. “Vamos juntos ao bares, andamos de mãos dadas quando queremos e não percebo olhar torto para a gente. Só vi isso uma vez, mas nem partiu de morador, foi um turista que falou bobagem”, conta Igor, que é budista. “Nós dividimos as despesas e tudo o que compramos para a casa. A gente curte ficar em casa juntos e aproveitamos bastante a companhia um do outro nos eventos da cidade”, acrescenta.



ESCOLHA SEM MEDO

Juntas há 18 anos, as professoras Celeste Libania, de 43 anos, e Rosane de Almeida Pires, de 47, de Belo Horizonte, veem uma realidade diferente da qual enfrentavam e já começam a expor sua opção sexual numa sociedade mais receptiva e respeitosa, acredita Celeste. “As mulheres já andam de mãos dadas nas ruas e isso era impossível para a gente”, conta ela, que ainda se sente desconfortável em demonstrar esse tipo de carinho em determinados lugares. 

Celeste lembra que os homossexuais da sua geração levavam mais tempo para assumir a escolha. No caso dela, isso ocorreu aos 25 anos, depois até de se relacionar com homens. Ela diz que a sociedade passou a discutir mais o assunto, deixando de acreditar nos estereótipos. “No passado, a gente se descobria ou se revelava bem mais tarde. Mas acho que essa tranquilidade crescente que a gente percebe nas ruas com os homoafetivos está ligada à forma como nos colocamos diante da sociedade. Na minha época, a sociedade era mais preconceituosa e a ideia que se fazia era de promiscuidade. No país, 53,8% dos casais homossexuais que moram juntos são mulheres, segundo o Censo 2010.

Para o coordenador geral do Movimento Gay de São João del-Rei e Região das Vertentes, Carlos Bem, Tiradentes é uma cidade gay friendly. “Os eventos que movimentam a cidade sempre recebem muita gente de fora, inclusive homossexuais. Vem muita gente de outros estados e outros países até para abrir restaurantes e pousadas. Essa pode ser uma das hipóteses para a cidade estar se destacando dessa forma.” 

Raça predomina na escolha de parceiro 
Publicação: 18/10/2012 04:00
Brasília – A pesquisa do IBGE comprova que a raça é fator predominante na escolha de parceiros conjugais. Dados do Censo 2010 mostram que 70% dos casamentos no país ocorrem entre pessoas de mesma cor e que as mulheres pretas (7% da população) são as que menos se casam. Entre os fatores que levados em conta na escolha de um parceiro estão a renda, a educação e a cor ou raça. São esses quesitos que influenciam a miscigenação e a mobilidade social, explica o pesquisador José Luis Petruccelli.

Nos últimos 10 anos, as uniões em função da cor ou raça praticamente não se alteraram. Em 2010, 69,3% das pessoas se uniram a outras de mesma cor ou raça, sendo que, em 2000, eram 70,9%. Se os casamentos não fossem influenciadas por questões raciais, o índice deveria ser em torno de 50%, embora já tenha sido de 80% em 1980.

“Isso desconstrói o mito da altíssima miscigenação e da harmonia racial. Há uma seletividade, há um viés pela escolha do parceiro por cor ou raça”, disse Petruccelli. Como os pretos e pardos (negros) estão entre os grupos com menor rendimento e nível de instrução, o pesquisador lembra que há uma “justaposição” de fatores que indicam uma “racialização” na escolha do parceiros.

O casamento entre pessoas de mesma cor ou raça é maior entre os brancos (74,5%), pardos (68,5%) e índios (65%), neste caso, relacionado à preservação dos povos. Entre homens e mulheres, chama a atenção a maior possibilidade de mulheres pretas ficarem solteiras. Entre as brasileiras com mais de 50 anos, elas são maioria na categoria “celibato definitivo”, que nunca viveram com cônjuge.

Atualmente, 68,2% da população se casaram com pessoas do mesmo nível de instrução. As mulheres são mais exigentes, nesse critério. Do total de profissionais com ensino superior completo, 51% delas escolheram homens desse grupo. Entre eles, 47% fizeram escolha semelhante.

NÚMERO DE CASAIS SEM FILHOS AUMENTOU 
Publicação: 18/10/2012 04:00

Filhos estão perdendo espaço na família brasileira. De acordo com o Censo 2010, mais de um quinto (20,2%) das famílias era formado por casais sem filhos, enquanto em 2000 esse percentual era de 14,9%. Minas, apesar de uma diferença mais pequena,  apresentou também acréscimo no número de casais sem filhos (de 11% para 13,4% das famílias).

De acordo com a demógrafa  Luciene Longo, o aumento está ligado tanto à opção por não ter herdeiros, mas também ao fato de casais estarem postergando a paternidade. “Há também influência de maior expectativa de vida, os filhos se casam e os pais continuam morando sozinhos”, comenta. O Censo também mostrou que 13,1% das famílias em Minas são formadas por mulheres sem marido e com filhos, enquanto o contrário, quando o marido vive sozinho com os filhos, representa apenas 1,9%.

O Censo mostrou um aumento das famílias sob responsabilidade das mulheres, que passou de 22,2% em 2000 para 37,3% em 2010. Uma novidade foi a investigação sobre a responsabilidade compartilhada entre o casal. Nos domicílios ocupados por apenas uma família, 34,5% estavam nessa condição, o que soma 15,8 milhões de casas.

De acordo com o técnico do IBGE Gilson Mattos, nas famílias secundárias, que convivem com a principal, foi verificado que 53,5% são chefiadas só por mulheres. “Provavelmente, por conta de um divórcio, uma filha volta para a casa dos pais ou a filha tem um filho, mas não contrai matrimônio, continua na casa dos pais.”

Outro dado divulgado foi o aumento na proporção de unidades domésticas unipessoais (com apenas um morador), que passaram de 9,2%, em 2001, para 12,1% em 2010. A coordenadora da pesquisa, Ana Lúcia Saboia, explica que, em muitos casos, são idosos cujos filhos já saíram de casa e perderam seus cônjuges. 

FAMÍLIAS RECONSTITUÍDAS


Pela primeira vez, o Censo 2010 incluiu no questionário aplicado a todos os domicílios a pergunta sobre a situação dos filhos nas famílias. Foi verificado se o filho é do casal, apenas do responsável ou apenas do cônjuge, além de outras configurações. A coordenadora da pesquisa, Ana Lúcia Sabóia, chama a atenção para essa nova classificação, chamada pelo IBGE de famílias reconstituídas, que somam em torno de 16% do total.

“Até então, pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) e pelo Censo, o Brasil era um mar de tranquilidade, todo mundo era casal com filho, mas você não sabia filhos de quem eles eram. Esse perfil mudou um pouco, tem a ver com o senso comum, de que hoje está havendo mais divórcios, as pessoas se juntam em configurações que não são as tradicionais. Você ouve falar do casal: o meu filho, o seu filho e os nossos filhos”, explicou.

O Censo 2010 registrou 57 milhões de unidades domésticas. Desse total, quase 50 milhões eram habitadas por duas pessoas ou mais com parentesco. Mas a pesquisa mostrou que existem 4 milhões de unidades domésticas com famílias conviventes, proporção que subiu de 13,9%, em 2001, para 15,4%. Além disso, 91% dessas têm apenas dois núcleos familiares, mas 3,6 mil casas tinha cinco ou mais famílias.

Gilson Mattos ressalta que a maioria das famílias é do tipo mais tradicional.  (FA e agências)


EMIGRAÇÃO
Minas Gerais é o estado com maior população morando fora, de acordo com o dados do Censo 2010. São mais de 3,6 milhões de mineiros, o equivalente a 13,6% da população, residindo para além das divisas estaduais. A maior parte teve como destino o estado de São Paulo, onde moravam, em 2010, 1,6 milhão de mineiros. Entre chegadas e partidas, Minas perde mais população do que ganha e, apesar de contabilizar mais de 21 milhões de pessoas naturais do estado, tem 19,8 milhões de habitantes. Depois de Minas, Bahia (3,1 milhões), São Paulo (2,4 milhões) e Paraná (2,2 milhões) foram os estados com os maiores volumes de população natural residindo em outras unidades da federação. A maior parcela dos não naturais residentes no Rio de Janeiro nasceu em Minas, Paraíba e Ceará, que, juntos, alcançaram 45,9% do total de não naturais.

Evangélicos se casam mais 
Segmento é o que registrou o maior percentual de uniões formais entre todas as religiões, de acordo com o Censo 2010. Maior quantidade de divórcios ocorre entre os espíritas 
Flávia Ayer e Paula Sarapu
 “Se os evangélicos se casam mais, é porque essa é a orientação da Bíblia”, diz o pastor Sérgio Ricardo Carvalho de Oliveira, de 38 anos, casado há 13 anos com Aline Pereira de Oliveira, de 32. É dessa forma que o líder religioso justifica o fato de haver maior concentração de casados entre os evangélicos do que em qualquer outra religião, de acordo com dados do Censo 2010, divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O grupo em Minas conta com 43% de casados e apenas 19,9% de uniões consensuais.

Com dois filhos, Sérgio Ricardo e a mulher se conheceram na igreja, no grupo de jovens do qual também participava o irmão dela. O namoro durou três anos e meio e, então, eles assinaram os papéis e ganharam a bênção de Deus. Sérgio diz que casar e constituir família são objetivos de vida dos evangélicos, que passam pela importância da castidade, símbolo pregado à juventude. “Normalmente, os evangélicos se casam com pessoas da mesma religião por questão de afinidade, por convivência mais próxima e por buscarem as mesmas diretrizes para cuidar da família”, explica o pastor.

O levantamento do IBGE, que faz o cruzamento de dados de nupcialidade com religião e grau de instrução, aponta ainda maior percentual de divorciados entre espíritas e de uniões consensuais entre aqueles que se declararam sem religião. Enquanto a média de divorciados gira em torno dos 3% entre católicos e evangélicos, no grupo de espíritas, esse percentual chega a 6,9%. Já em relação às uniões consensuais, enquanto nas demais crenças os números não ultrapassam os 30%, entre o grupo dos sem religião, as uniões sem papel passado chegam a 47,7% do total.

De acordo com a analista do IBGE, a demógrafa Luciene Longo, os dados do Censo 2010 reforçam que o casamento formal está vinculado também com o perfil socioeconômico. “Casar formalmente é caro e, por isso, muitos casais com renda mais baixa optam por morar juntos e dispensam formalidades. Enquanto entre mineiros de 30 a 34 anos, com renda superior a 20 salários mínimos, o casamento no civil e no religioso chega a 64% das uniões, entre pessoas da mesma faixa etária e renda que vai de dois a três salários mínimos, 44% das uniões são firmadas no cartório e abençoadas na igreja. 

UNIÃO FORMAL
 A demógrafa Ana Paula de Andrade Verona, do Departamento de Demografia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)/Cedeplar, reforça que a religião é apenas um dos aspectos que pode influenciar o casamento. No caso dos evangélicos, por exemplo, ela diz que algumas igrejas pentecostais assumem claramente a preferência pela união formal, mas lembra que a renda e a escolaridade contam também muito na decisão dos casais.

“Em geral, as igrejas pentecostais, que em grande parte são protestantes, falam sobre a preferência do casamento formal, como a melhor saída. Não se pode garantir só a influência da religião porque há outros aspectos que também se relacionam, como a renda e a escolaridade. Sabe-se que quem tem renda mais alta costuma formalizar mais a união também. Por isso, os espíritas poderiam estar mais expostos ao divórcio, uma vez que pertencem a uma das religiões com número de seguidores de renda mais alta e escolaridade maior", explica.

Segundo ela, os dados do IBGE são informações de momento porque, no caso da religião, permite-se mudança. “Intuitivamente, poderíamos dizer que o ateu não se casa formalmente porque não acredita em normas de comportamento, já que não tem uma crença religiosa nem frequenta a igreja. Mas não sabemos o passado dessa pessoa e por isso não dá para avaliar completamente essa relação", explica Ana Paula.
ESTADO DE MINAS
18/10/2012