segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Paulo Brossard - E a presidente riu dos críticos

A senhora presidente da República, em 11 de setembro passado, estabeleceu a redução da tarifa elétrica em 16% para residências e 28% para a indústria e a medida agradou a meio mundo para não dizer mundo e meio, pois sempre é bem-vinda a redução de ônus, seja qual for, e é notória a exagerada tarifa em causa; se isto vale em relação a brasileiros e estrangeiros residentes no país, quanto ao consumo em suas residências, o mesmo vale quanto à indústria, que na energia tem um dos fatores que compromete a competitividade dela nos mercados interno e externo. Pouco depois, a redução foi majorada para 18% e 32%, respectivamente, aliás, usada para maior gabo à chefe do Executivo. Há quem entenda que a redução se explicaria por estarem previstos reajustamentos de tarifa a várias concessionárias no ano em curso, de fevereiro a dezembro, ou poderia explicar-se pela munificência do governo, já em aberta campanha eleitoral, embora a destempo à luz da lei.

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Nova pornografia - Lúcia Guimarães

Cheguei a pensar que havia acordado na década errada. Seria fevereiro de 2003? Um documento obtido por um repórter atentava contra a Constituição e a língua inglesa, costurando um arrazoado para assassinar cidadãos americanos no exterior, se considerados um perigo iminente para a segurança americana. Definição de perigo iminente? Confie em nós, povo.

Grandes jornais confessaram que, há um ano, escondem dos leitores, a pedido da Casa Branca, o fato de que há uma base secreta na Arábia Saudita de onde decolam os drones, os aviões sem pilotos comandados por controle remoto. Os drones que matam não só os suspeitos de terrorismo no Paquistão, no Iêmen, na Somália, mas também civis transformados em dano colateral.

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A POÉTICA DE SYLVIA PLATH

 O estado de SãoPaulo - 11/02/2013

Escritora de estilo forte e hábil em unir técnica e paixão mantém sua força e genialidade 50 anos após sua morte

Rodrigo Garcia Lopes
ESPECIAL PARA O ESTADO

“Senhoras e senhores / Eis minhas mãos,meus joelhos. / Posso ser só pele e osso / No entanto sou a mesma, idêntica mulher”, escreve Sylvia Plath, com sua peculiar ironia, em Lady Lazarus.
E, no mesmo poema: “A multidão, comendo amendoim / Se aglomera para ver / Desenfaixarem minhas mãos e pés –/ O grande strip-tease”.

A poeta, que se matou há exatamente 50 anos, parece aqui antever o circo em torno de seu suicídio, a espetacularização de sua imagem e sua transformação em mártir feminista, e que ainda continua com força em nossos dias de culto à celebridades instantâneas.

Por outro lado, na academia, por muito tempo se privilegiaram os aspectos biográficos e sensacionalistas (o abandono e a traição de Hughes), eclipsando o valor de sua arte e de sua intervenção estética na poesia dos anos 50-60.

Como lembra Camile Paglia, o que ocorreu na esteira do furor feminista que acabou tomando conta do discurso em torno da poeta americana foi que “o engajamento erudito de Plath com escritores canônicos homens foi minimizado e suprimido”. De fato, os poetas de sua devoção eram, além de Emily Dickinson, Blake, D.H. Lawrence, Roethke, Eliot, Yeats, e Lowell (que foi seu professor). Plath soube superar esse cânone pesadíssimo e, livre de angústias de influências, criar uma dicção poética singular.

A canonização, a fama e o rótulo de “poeta confessional” ou “suicida” foram amargos para a poesia de Plath. Ainda em vida (tinha apenas 30 anos quando morreu), ela alertava para a recepção de seus poemas como meros “gritos do coração”. “Creio que se deva saber controlar as experiências, até as mais terríveis, como a loucura, como a tortura e se deva saber manipulá-las com uma mente lúcida que lhe dê forma.” Ou seja, não tanto poemas sobre experiências mas como experiências. Seria mais correto chamar su poesia de “conficcional”, pois ela soube tomar fatos autobiográficos, históricos, míticos, e adaptá-los à sua própria mitologia pessoal. Alguns temas: incesto, aborto, suicídio, doença mental, a opressão da mulher, a maternidade, o corpo, a morte.

De modo não panfletário, Plath soube como poucas transformar suas experiências em desafios à sua própria habilidade poética, como atestam obras-primas como 40 Graus de Febre, Rival, Ariel, A Chegada da Caixa de Abelhas, Palavras e Papai (o equivalente feminino ao Uivo de Ginsberg). Poesia de imagens fortes e grande musicalidade, pedindo para serem lidos em voz alta, como os de Ariel. Ou como em Corte, onde podemos ver seu processo poético em ação: o corte no dedo serve de motivo poético para uma viagem alucinada e de imagens violentas: o polegar cortado assume as máscaras de um chapéu, de um escalpo de um “pioneiro”, uma garrafa de champanhe, um piloto camicaze, um membro da Klu- Klux-Klan, um moinho. Quase sempre ela parte de um incidente “menor” para falar de algo mais amplo (o Holocausto, Hiroshima).

Sylvia Plath foi uma artista da palavra mais que meramente a poeta “suicidada pela sociedade”. Dominava uma variedade de formas e tinha seu dicionário Webster como verdadeira bíblia. Seus melhores poemas ficaram como prova definitiva de sua genialidade poética, conseguindo unificar técnica e paixão. Mais: ela conseguiu fundir, como poucos poetas, o pessoal e o político, sem nunca esquecer, obviamente, o poético. Claro que uma poeta “forte” como Plath deixou sua influência, como em Anne Sexton, Sharon Olds, Adrienne Rich, além do próprio Ted Hughes (que emulou seu estilo em Cartas de Aniversário).

No Brasil, encontram-se traduções, ecos e citações de Plath na poesia de Ana Cristina Cesar (1952-1983), entre outras escritoras. Apesar de ter escrito também prosa (um romance, contos, diários, cartas), Plath se definia sobretudo como poeta, uma artesã: “Poesia é uma disciplina tirânica. Você tem de ir tão longe, tão rápido, em tão pouco tempo, que nem sempre é possível dar conta do periférico. Num romance talvez eu possa conseguir mais da vida, mas num poema eu consigo uma vida mais intensa”.

RODRIGO GARCIA LOPES É POETA, COMPOSITOR E TRADUTOR. ESTÁ LANÇANDO SEU SEGUNDO DISCO, CANÇÕES, DO ESTÚDIO REALIDADE

LEITURA

Livros de Sylvia Plath
Ariel (Editora Verus)
Poemas (Iluminuras)
O Terno Tanto Faz
Como Tanto Fez (Rocco)

Obras sobre ela
A Mulher Calada
Eensaio de Janet Malcolm
(Companhia das Letras)
A Poética do Suicídio
em Sylvia Plath
Ensaio de Ana Cecília Carvalho
(Editora da UFMG)

O QUE QUE HÁ COM A SUA BARATINHA? - Joaquim Ferreira dos Santos

  

O GLOBO - 11/02/2013
Está na hora de mudar
o disco do carnaval e curtir
o lado B da viúva, do
brotinho e da madame


A mulata bossa nova vai me desculpar e a Maria Sapatão também. Mas é carnaval e eu, cansado de sair com elas em outras folias, queria cantar outras mulheres.

As marchinhas ressurgiram aqui neste espaço, numa série de crônicas exaltatórias, no início de 2006. A nega do cabelo duro era coisa só de gente muito velha, de carecas que entre as mulheres ainda se achavam os maiorais. Aquelas letras eram confetes coloridos de antigos carnavais dos quais só cronistas, eternos índios querendo apito, se lembravam.

Depois destas crônicas, verdadeiros gatos na tuba resfolegando no coreto do jardim, veio em 2007 o musical “Sassaricando”, de Rosa Maria Araújo e Sergio Cabral — e o resto é história, é cabeleira do Zezé, é daqui não saio, daqui ninguém me tira, e outros bigorrilhos aos quais o carnaval carioca agradece e sai pulando. É com esse que eu vou.

O problema é que está na hora de mudar o disco e curtir o lado B da viúva, do brotinho e da madame. Quero sassaricar, todo mundo quer, porque sem isso a vida é um nó, mas está na hora de pedir, vira meu bem, e cantar outras músicas no ouvido da festa. Deus me livre e guarde de pedir que se dê um tempo em Braguinha, Paquito e Romeu Gentil, ou Mirabeau, mas, saravá, meu pai, vamos deixar descansar as “Touradas de Madri”, o “Tomara que chova” e o “Tem nego bebo aí”. Há marchinhas que não acabam mais. Não vai aqui nenhum preconceito contra a cabeleira do Zezé ou a Chiquita Bacana, a gostosérrima existencialista cheia de razão. Elas serão cantadas sempre, pois um carnaval sem elas seria como um show dos Rolling Stones sem “Satisfaction”.

Pede-se apenas uma saudação também para a chegada do general da banda e aproveite-se para perguntar a ele que negócio é esse de “vara madura que não cai”. Louvemos ainda a Eva, querida, de quem todos queremos, pelo menos num carnaval, ser o seu Adão. Por que não entronizá-los nos novos cordões?

As novas gerações de cariocas tomaram gosto pelas marchinhas e, a propósito, foi lançado agora um ótimo CD com versões para crianças, feito pelo clã Martinho da Vila. Mas lá está de novo a jardineira sendo cantada como se fosse a única mulher do salão. Como se não houvesse Isaura (“hoje eu não posso ficar”), como se não houvesse Iaiá (“cadê o jarro?”) e a Maria Candelária (a alta funcionária que saltou de paraquedas e caiu na letra O).

Mamãe, eu quero mamar nas tetas da Maria Escandalosa, mesmo sabendo que desde criança ela dá alteração. Quero dançar o minueto, que vem lá do Municipal, outra delícia carnavalesca que o pirata da perna de pau, para que só ele brinque na boca da galera, escondeu no baú.

Marchinha de carnaval é muito mais do que atravessar o deserto do Saara, tomar uma latinha de cerveja com o sol a queimar a cara de todo mundo. É hora de lembrar a balzaquiana (“mulher só depois dos 30”), as macacas de auditório (“ela é fã da Emilinha”) e a garota Saint- Tropez (“com o umbiguinho de fora”). Vamos mudar o tom, embora, repita-se, nada aqui se tenha contra o bafo da onça e a merecida exaltação de que ele é o bom, é o bom, é o bom.

Vamos inventar uma nova cantada, garotão. Quando passar à sua frente aquela gata de penugem dourada na coxa, levante os braços e cante “você roubou meu sossego, você roubou minha paz”, outro clássico de Mirabeau, compositor pouco conhecido que, no entanto, deveria ser entronizado ao lado de Braguinha, Lamartine e João Roberto Kelly, como um dos reis do carnaval.

Já que a pândega está liberada, já que as moças estão cada vez mais divertidas, por que não brincar com elas cantando a irresistível “O que que há com a sua baratinha?”, que Orlando Silva gravou nos anos 40, no auge das corridas de automóvel no circuito da Gávea, e décadas depois Jorge Veiga confirmou em outra gravação, cheio de duplos sentidos, já com as baratinhas automobilísticas enterradas.

Neste carnaval eu quero rosetar, não quero mais saber de brincar só com vocês, nega maluca, louras, cor de laranja, 100 mil, e outras musas do carnaval Brasil. Quero carne nova,papos outros, e mais daquela que quando ela chega todo mundo grita, estou aí, nessa marmita. Viva o lado B da linda morena, abram alas para novos clássicos do carnaval.

Zé da Zilda e Zilda do Zé estão dizendo que o doutor mandou todo mundo gingar. Paquito e Romeu Gentil estão mandando todo mundo para Jacarepaguá, que lá mulher é mato e — carnaval é pra isso mesmo — todo mundo precisa se arrumar.

Se essa zorra não virar, se o bafômetro não acusar, a gente chega lá.