sábado, 27 de abril de 2013

PRELO

O Globo - 27/04/2013

HOMENAGEM A IGLESIAS

Dia 3 de maio, às 17h30m, o Instituto Moreira Salles
do Rio (R. Marquês de São Vicente 476)
homenageará o historiador e ensaísta Francisco
Iglesias — que faria 90 anos amanhã — num
encontro entre o escritor Silviano Santiago e o
historiador José Murilo de Carvalho. Em pauta,
estará não apenas a vasta obra e o trabalho de
Iglesias (1923-1999) como professor, mas também
sua relação com amigos como Carlos Drummond
de Andrade, Autran Dourado e Otto Lara Resende,
entre outros. No Blog do IMS, um texto de Elvia
Bezerra, coordenadora do acervo de literatura da
instituição, analisa a correspondência entre o
historiador e Otto (os arquivos de ambos estão
abrigados ali), composta de mais de 300 cartas.
Informações: 3284-7400.

SILVIANO SANTIAGO
O escritor acaba de ter seu livro de ensaios “As
raízes e o labirinto da América Latina” (Rocco)
publicado na Argentina pela Corregidor, com
tradução e prólogo de Mónica González Garcia. “Las
Raices y el Labirinto de América Latina”, que
aproxima as culturas brasileira e mexicana através
da obra de Sérgio Buarque de Holanda (“Raízes do
Brasil”) e Octavio Paz (“O labirinto da solidão”). O
livro é um dos lançamentos da Feira do Livro de
Buenos Aires, que começou dia 25 e segue até 13 de
maio.

TRABALHO NO BRASIL
Às vésperas do 1º de Maio, a Boitempo anuncia,
para a primeira quinzena do mês, o lançamento de
“Riqueza e miséria do trabalho no Brasil — Volume
II”, organizado por Ricardo Antunes, professor titular
de sociologia do trabalho na Universidade Estadual
de Campinas (Unicamp). Antunes é considerado
um dos maiores especialistas do país no assunto e a
nova obra (o primeiro volume saiu em 2007), que
reúne 24 artigos de autores distintos, dá
continuidade à sua ampla pesquisa sobre diversos
setores da economia brasileira .

“THIRD WORLD FIRST”
Escritores, poetas, jornalistas e acadêmicos
brasileiros estarão na Universidade de Brown, nos
Estados Unidos, dias 3 e 4 de maio, participando do
evento “Third World First: The Social Boom in
Brazil’s Literary Cultures”, promovido pelo
departamento de estudos brasileiros e portugueses
da instituição. Literatura e mobilidade social, acesso
ao conhecimento, cultura periférica e a proliferação
de festivais literários pelo país estarão presentes nas
palestras de Heloisa Buarque de Hollanda, Beatriz
Resende, Paulo Roberto Pires, Tatiana Salem Levy,
João Paulo Cuenca, Allan Rosa, Ferréz, Lanna Leite e
Vera Saboya.

ENTRE PALAVRA E IMAGEM
O Oi Futuro de Ipanema inaugura dia 3, às 19h, a
exposição “Poética e sinais”, com trabalhos do artista
espanhol (radicado no Rio ) Adolfo Montejo Navas. A
mostra, que integra o projeto Poesia Visual, sob curadoria 
de Alberto Saraiva, reúne poemas visuais,vídeos, fotografias
 (como as da série “Código deBarras”, acima) e instalações 
que vão ocupar o térreoe a galeria do segundo andar da instituição.

EDGAR HILSENRATH
A Gryphus Editora publicará em junho a principal
obra do judeu alemão Edgar Hilsenrath, “O nazista e
o barbeiro”, que conta a trajetória de um integrante
da SS nazista, depois de assassinar centenas,
assume o papel de uma de suas vítimas e se
transforma num respeitável barbeiro em Tel Aviv.
Por conta dos romances que misturam horror e
humor ácido, criticando tanto alemães quanto
judeus, até 1977 Hilsenrath (hoje com 86 anos)
permanecia inédito, recusado pelas editoras de seu
país. “O nazista e o barbeiro” foi lançado
primeiramente nos EUA e só depois do sucesso
(mais de 200 mil cópias vendidas) a obra foi
publicada na Alemanha. A Gryphus lançará ainda
“Fuck America”, relato sarcástico da vida do escritor
na Nova York dos anos 50.

AMOR NO SÉCULO XIX
A Editora Arqueiro está investindo numa nova frente
de ficção. Estão chegando às livrarias três séries de
romances de época, ambientados no século XIX,
com personagens mergulhados em cenas ardentes,
que agradam em cheio às mulheres. Os primeiros
livros são “O duque e eu”, de Julia Quinn; “Desejo à
meia-noite”, de Lisa Kleypas, e “As regras da
sedução”, de Madeline Hunter. Serão no total 17
títulos das três escritoras americanas.

“A Biblioteca George W. Bush vai ter uma exposição sobre tortura?”

TIM NAFTALI
Historiador americano, ex-diretor da Biblioteca-Museu Presidencial Richard Nixon


O Globo - 27/04/2013

Desde que deixou a Casa Branca, em
2009, com um dos piores índices de
aprovação da história americana, o
ex-presidente republicano George
W. Bush tem se mantido longe dos holofotes.
Dedica-se mais ao beisebol e ao recém-adquirido
hábito de pintar do que à política. Na última
quinta-feira, porém, voltou à cena com a
inauguração da Biblioteca-Museu Presidencial
George W. Bush, em Dallas, no estado do Texas,
que governou por seis anos.

O edifício abriga os documentos do governo
Bush e exibe ícones de momentos cruciais de
seu mandato. Alguns em tom de desafio, como
uma cédula eleitoral da Flórida, onde foi decidida
sua vitória em 2000, no colégio eleitoral,
sobre o democrata Al Gore, que ganhou no voto
popular. Outros de gosto duvidoso, como uma
viga de aço retorcida do World Trade Center,
cuja destruição, nos atentados de 11 de setembro
de 2001, mudou o curso de sua presidência.

No dia da inauguração, o historiador americano
Tim Naftali, ex-diretor da Biblioteca-Museu
Richard Nixon, usou a experiência de
quem administrou o legado de outro presidente
impopular para analisar o futuro da nova
instituição. Em artigo na revista “Slate”, lembrou
que as bibliotecas presidenciais são geridas
pelo Arquivo Nacional, portanto devem
servir ao interesse público, e não à “reabilitação
da imagem do ex-presidente”.

Naftali, que promoveu uma exposição sobre
Watergate na Biblioteca Nixon, perguntou se a
Biblioteca Bush tratará da prática de tortura na
“guerra ao terror”: “não há razão para que debates
não ocorram no edifício que guarda os
documentos que explicam essas políticas”.

Por ora, o mais próximo disso é a sala chamada
Teatro das Decisões, espaço interativo onde
o visitante é convidado a se posicionar sobre
questões centrais do governo Bush (por exemplo:
invadir o Iraque ou deixar Saddam Hussein
no poder?). Escolha feita, o ex-presidente
aparece, em vídeo, justificando sua decisão.

Darwin e a prática da 'Salami Science' - FERNANDO REINACH

O ESTADO DE S.PAULO - 27/04/2013

Em 1985, ouvi pela primeira vez no Laboratório de Biologia Molecular a expressão "Salami Science". Um de nós estava com uma pilha de trabalhos científicos quando Max Perutz se aproximou. Um jovem disse que estava lendo trabalhos de um famoso cientista dos EUA. Perutz olhou a pilha e murmurou: "Salami Science, espero que não chegue aqui". Mas a praga se espalhou pelo mundo e agora assola a comunidade científica brasileira.

"Salami Science" é a prática de fatiar uma única descoberta, como um salame, para publicá-la no maior número possível de artigos científicos. O cientista aumenta seu currículo e cria a impressão de que é muito produtivo. O leitor é forçado a juntar as fatias para entender o todo. As revistas ficam abarrotadas. E avaliar um cientista fica mais difícil. Apesar disso, a "Salami Science" se espalhou, induzido pela busca obsessiva de um método quantitativo capaz de avaliar a produção acadêmica.

No Laboratório de Biologia Molecular, nossos ídolos eram os cinco prêmios Nobel do prédio. Publicar muitos artigos indicava falta de rigor intelectual. Eles valorizavam a capacidade de criar uma maneira engenhosa para destrinchar um problema importante. Aprendíamos que o objetivo era desvendar os mistérios da natureza. Publicar um artigo era consequência de um trabalho financiado com dinheiro público, servia para comunicar a nova descoberta. O trabalho deveria ser simples, claro e didático. O exemplo a ser seguido eram as duas páginas em que Watson e Crick descreveram a estrutura do DNA. Você se tornaria um cientista de respeito se o esforço de uma vida pudesse ser resumido em uma frase: Ele descobriu... Os três pontinhos teriam de ser uma ou duas palavras: a estrutura do DNA (Watson e Crick), a estrutura das proteínas (Max Perutz), a teoria da Relatividade (Einstein). Sabíamos que poucos chegariam lá, mas o importante era ter certeza de que havíamos gasto a vida atrás de algo importante.

Hoje, nas melhores universidade do Brasil, a conversa entre pós-graduandos e cientistas é outra. A maioria está preocupada com quantos trabalhos publicou no último ano - e onde. Querem saber como serão classificados. "Fulano agora é pesquisador 1B no CNPq. Com 8 trabalhos em revistas de alto impacto no ano passado, não poderia ser diferente." "O departamento de beltrano foi rebaixado para 4 pela Capes. Também, com poucas teses no ano passado e só duas publicações em revistas de baixo impacto..." Não que os olhos dessas pessoas não brilhem quando discutem suas pesquisas, mas o relato de como alguém emplacou um trabalho na Nature causa mais alvoroço que o de uma nova maneira de abordar um problema dito insolúvel.

Essa mudança de cultura ocorreu porque agora os cientistas e suas instituições são avaliados a partir de fórmulas matemáticas que levam em conta três ingredientes, combinados ao gosto do freguês: número de trabalhos publicados, quantas vezes esses trabalhos foram citados na literatura e qualidade das revistas (medida pela quantidade de citações a trabalhos publicados na revista). Você estranhou a ausência de palavras como qualidade, criatividade e originalidade? Se conversar com um burocrata da ciência, ele tentará te explicar como esses índices englobam de maneira objetiva conceitos tão subjetivos. E não adianta argumentar que Einstein, Crick e Perutz teriam sido excluídos por esses critérios. No fundo, essas pessoas acreditam que cientistas desse calibre não podem surgir no Brasil. O resultado é que em algumas pós-graduações da USP o credenciamento de orientadores depende unicamente do total de trabalhos publicados, em outras o pré-requisito para uma tese ser defendida é que um ou mais trabalhos tenham sido aceitos para publicação.

Não há dúvida de que métodos quantitativos são úteis para avaliar um cientista, mas usá-los de modo exclusivo, abdicando da capacidade subjetiva de identificar pessoas talentosas, criativas ou simplesmente geniais, é caminho seguro para excluir da carreira científica as poucas pessoas que realmente podem fazer descobertas importantes. Essa atitude isenta os responsáveis de tomar e defender decisões. É a covardia intelectual escondida por trás de algoritmos matemáticos.

Mas o que Darwin tem a ver com isso? Foi ele que mostrou que uma das características que facilitam a sobrevivência é a capacidade de se adaptar aos ambientes. E os cientistas são animais como qualquer outro ser humano. Se a regra exige aumentar o número de trabalhos publicados, vou praticar "Salami Science". É necessário ser muito citado? Sem problema, minhas fatias de salame vão citar umas às outras e vou pedir a amigos que me citem. Em troca, garanto que vou citá-los. As revistas precisam de muitas citações? Basta pedir aos autores que citem artigos da própria revista. E, aos poucos, o objetivo da ciência deixa de ser entender a natureza e passa a ser publicar e ser citado. Se o trabalho é medíocre ou genial, pouco importa. Mas a ciência brasileira vai bem, o número de mestres aumenta, o de trabalhos cresce, assim como as citações. E a cada dia ficamos mais longe de ter cientistas que possam ser descritos em uma única frase: Ele descobriu...

Link para Leminski - José Miguel Wisnik


 O GLOBO

27/04/2013

Um corpo estranho tem atravessado como um cometa a lista dos best-sellers nas últimas semanas: 'Toda poesia', de Paulo Leminski

Um corpo estranho tem atravessado como um cometa a lista dos best-sellers nas últimas semanas: o volume “Toda poesia” de Paulo Leminski. Um catatau cor de laranja em meio aos não sei quantos tons de cinza, um quinau de poesia flanando distraidamente em meio à corrida dos mais vendidos, com um pique vencedor (estou brincando, aqui, com o título de um dos seus livros, o “Distraídos venceremos”). Como diz o poeta curitibano, a poesia é um inutensílio que não tem nenhuma outra justificativa que não seja “a própria razão de ser da vida”, e de fazer parte, como o orgasmo e a amizade, “daquelas coisas que não precisam ter um porquê: pra que porquê?”. É ironicamente empolgante, além de intrigante, que a obra reunida do poeta, morto em 1989, se destaque de repente, inesperada, em meio à multidão de livros feitos ostensivamente para vender.

Ninguém, ao que eu saiba, sabe explicar a razão do fenômeno (mais de 20 mil exemplares em um mês e meio). E como os fenômenos de venda tornaram-se a “razão de Estado” de tudo quanto gira sob o controle de um mercado altamente administrado, é no mínimo curioso esse não saber sobre um certo poder imprevisível da poesia. Esperados sucessos que fracassam são mais comuns, nesse mundo de cálculos, do que fracassos que sobem inesperadamente à parada de sucessos. Pois estes desvelam, ao contrário, a emergência do incomum. Todos os editores que se aventuram no gênero trabalham com o fato de que o alcance monetariamente palpável da poesia é limitado por definição: “poesia não vende”. Envolvido na edição do livro com um texto escrito para ele (“Nota sobre Leminski cancionista”), pude ver de perto o quanto não estava no horizonte da editora uma expectativa de recepção quantitativamente maiúscula.

É certo que o senso poético de Leminski conversa de perto com a sua experiência publicitária – uma prontidão certeira, uma agilidade verbal e mental (que se liga também à sua relação com as artes marciais e a com a poesia japonesa), com a concisão e a vocação icônica que o fazem encontrar imagens sintéticas derivadas de clichês postos à deriva. Mesmo a prosa experimental e vanguardista do “Catatau” não deixa de ser uma coleção alucinante de jingles alterados sobre frases feitas. A dupla face vanguardista e pop, anunciada pela poética leminskiana, encontrou uma perfeita correspondência no hit maker Arnaldo Antunes, que a desenvolveu na poesia e na canção. A expansão desse campo talvez tenha contribuído para a onda de interesse retrospectivo por Leminski.

O bigode do “polaco louco paca”, à la Solidarnosc, já era, por sua vez, uma espécie de layout ambulante, um autorretrato metonímico que, aproveitado engenhosamente no projeto gráfico e promocional do livro, funcionou certamente como uma senha chamativa imediatamente reconhecível no meio do turbilhão das gôndolas das livrarias. Toda a guerra editorial contemporânea se aplica, aliás, a conquistar um lugar visível no congestionado espaço das megalivrarias, pressionadas pelo ritmo contínuo dos lançamentos buscando fisgar a atenção instantânea do comprador. A resposta instantânea realimenta, num momento-chave, a atenção do vendedor, que põe ou não o livro em espaço de maior destaque, promovendo vendas que, se sobem à lista dos mais vendidos, alavancam mais vendas, convertendo sucesso em sucesso. É de um tal círculo virtuoso e tautológico, disparado por fatores em parte imponderáveis, que dependeu a “laranja mecânica” de Leminski, associada ao carisma da sua figura e ao atrativo do objeto gráfico, para vir a contrair o vírus do best-seller.

Tudo isso continua a não explicar o porquê do sucesso insólito, embora sirva para situá-lo um pouco. Mas afinal, podemos perguntar também, pra que porquê? Um público de muitas idades, e jovem em essência, dá sinais de achar graça na gratuidade vitalmente comprometida da poesia de Paulo Leminski. Pois todo o circuito material e comercial descrito acima não avançaria numa direção tão improvável se não fosse guiado por uma necessidade interna e por uma confirmação de reconhecimento, passado o primeiro disparo do processo. Há uma sensível necessidade de poesia no ar, e ela foi identificada nesse poeta inquieto, capaz de ir fundo nas suas formas ancestrais e nas suas mutações contemporâneas, de transcender polaridades e de exercer a leveza profunda.

<SW,15>Durante algum tempo Curitiba não queria deixar Paulo Leminski morrer, como se ele tivesse que continuar imaginariamente ali, frequentando os mesmos lugares e as mesmas rodas. Mas o grande teste de um poeta é morrer, quando ele revela, como é o caso, o seu surpreendente poder de renascer.