sábado, 8 de fevereiro de 2014

Racismo e rolezinho - JC Teixeira Gomes

A Tarde/BA 08/02/2014

JC Teixeira Gomes
Jornalista, membro da Academia de Letras da
Bahia
jcteixeiragomes@hotmail.com

Precisamos evitar
no Brasil o exercício
do pensamento
que discrimina a
pretexto de combater
a discriminação.
Precisamos combater
o racismo
ao contrário

Tenho evitado escrever sobre racismo pela delicadeza de um tema que traduz imensas dívidas da sociedade brasileira para com a população negra. Mas dois artigos recentes sobre rolezinhos me fizeram mudar de ideia, um do meu amigo Jorge Portugal, outro do deputado petista Luiz Alberto. O primeiro vê tais manifestações como “caso de política”. Há anos, diz ele, os garotos de bairro populares, sobretudo negros, sentiam-se discriminados no “pedaço dos barões” (!), incluindo shoppings. Hoje, resolveram ocupar tais espaços “com a linguagem de seus corpos jovens e mestiços”.

Já para o petista Luiz Alberto, radical e contundente, discriminações em shoppings paulistas contra “jovens da periferia, na maioria negros” (sic), “num lugar onde não são esperados”, causariam pânico. A denúncia acusa “uma reação das pessoas brancas” (!), incomodadas como donas do “espaço do poder”, revelando “a face perversa” da exclusão orquestrada por brancos ricos contra negros pobres. Só faltou dizer que a Ku Klux Klan invadiu shoppings brasileiros para expulsar negros, num texto agressivo, cuja ideologia rançosa expõe objetivo eleitoreiro.

Não é a cor da pele que define presenças em shoppings: é o seletivo e excludente consumismo capitalista. Empresários não vacilam diante de lucros: o megaempresário Odebrecht está construindo em Cuba um porto para o comunista Fidel, com o farto dinheiro enviado pelo PT de Luiz Alberto. Não me consta que Pelé tenha sido barrado em um único shopping do mundo.

Templos do consumismo, shoppings são também centros de convivência social. À comodidade da concentração de lojas, acrescentam o prazer dos passeios em segurança. Sendo espaços limitados, grandes massas em seu interior podem intimidar fregueses, dificultar vendas e ameaçar patrimônios. Não por causa específica da presença de jovens negros: rolezinhos são formações compósitas e incluem negros, brancos, mulatos, louros, índios etc., como o próprio Brasil. Multidões em áreas fechadas podem ser ordeiras ou ficar imprevisíveis como bois em curral, doidos para arrombar a cerca ante um simples estalo. Lembremos que arruaceiros desvirtuaram as manifestações pacíficas do povo nas ruas brasileiras em 2013.

Precisamos evitar no Brasil o exercício do pensamento que discrimina a pretexto de combater a discriminação. Simplificando: precisamos combater o racismo ao contrário. Desde alguns anos, generalizou- se a absurda ideia de que usar a palavra “negro” era ofensa racial e passaram a trocá-la por “afrodescendente”. Mas os linguistas que o professor Jorge Portugal tão bem conhece lembram que existe o vocábulo “polissemia”, para explicar os conteúdos múltiplos das palavras. “Negro” pode designar não apenas a cor da pele, mas também “escuridão”, “treva” ou “dificuldade”, como ocorre quando dizemos “a situação está negra”. A eficiente repórter de TV Glória Maria já afirmou, com orgulho: “Eu não sou afrodescendente, eu sou é negra!”

Qualquer exaltação de uma raça particular é racismo. Na década de 70, quando eu chefiava o Jornal da Bahia, fui procurado pelo emérito sociólogo Thales de Azevedo, que me advertiu, ao ler que o setor de promoção do jornal realizava o concurso “A Mais Bela Mulata da Bahia”. Thales disse: “Vocês estão fomentando o racismo!”. O mestre estava certo. Hoje, no entanto, tornaram-se comuns no Brasil designações como “Dia da Beleza Negra”, da “Cultura Negra”, conjunto “Raça Negra”, há uma revista, “Raça”, dedicada apenas a negros, etc. Imaginem Jorge Portugal e o deputado Alberto se alguém andasse elogiando um conjunto “Raça Branca”!

Enfim, preocupados ambos em denunciar o rolezinho como a revolta de negros pobres contra brancos opressores, andam esquecidos de fazer o que deveriam: enaltecer o mais aplaudido negro do Brasil atual, emergente da pobreza para tornar nossa Justiça respeitada: refiro-me ao magistrado Joaquim Barbosa, que, aliás, meteu o branquelo Dirceu e outros petistas corruptos na Papuda, resgatando a dignidade nacional. Garanto a meus articulistas que o negro Joaquim Barbosa frequenta shoppings sob aplausos.

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