sexta-feira, 23 de maio de 2014

Eduardo Almeida Reis - Pulseirinha‏

Pulseirinha

Diz a internet que, em guarani, urubu quer dizer urubu mesmo, enquanto pungá é cocô de urubu

Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 23/05/2014

 



Faz sucesso no mundo esportivo eletrônico uma pulseirinha de plástico, relativamente barata, que contém dispositivo eletroeletrônico capaz de informar quantos passos você deu e quantas calorias queimou. Presumo que informe outras coisas, mas não me interessei pelo equipamento, que conheci numa crônica de Cora Rónai, porque não pratico esportes e sou craque em calorias, autor de ótimo livro sobre o assunto.

Há outros “equipamentos” capazes de refletir nosso estado de espírito: um deles é o charuto. Ainda hoje, meu charuto matinal durou três horas e vinte minutos. Charuto baiano vendido pelo senhor Hugo de Castro, poeta residente no Recôncavo Baiano, amigo do poeta J. P. Alvim Guimarães, experiente charuteiro residente em Juiz de Fora, dos primeiros leitores do EM a elogiar meu desempenho como cronista-Fifa no caderno de Esportes. Desempenho também elogiado pelo senhor Manoel Rezende de Mattos Cabral, o Nelinho, o grande right back da seleção e do futebol internacional.

Quando me reconheceu num supermercado de BH, o famoso beque perguntou: “Tu não é o Eduardo? Faz muito bem: não entende nada de futebol e vai logo dizendo que não entende, mas entende mais do que estes caras que acham que entendem e não sabem porra nenhuma”.

Sua observação suscita alto philosophar: quem entende de futebol? Como é possível “entender” esporte de tamanha complexidade. “Melhores técnicos” fracassam dirigindo grandes times, que se recuperam orientados por técnicos desconhecidos. Os melhores jogadores têm fases inspiradas e períodos em que não jogam absolutamente nada. O assunto é complexo; não me agrada escrever sobre ele. Prefiro falar de charutos iguais, da mesma bitola e procedência, que às vezes não duram uma hora e outras vezes, como hoje cedo, demoram três horas e vinte minutos.

 Suspeito

Acho que temos nova palavra-ônibus na praça, justo no momento em que, no Brasil inteiro, queimam-se ônibus às dúzias e um só cavalheiro, irmão gêmeo de conhecido traficante morto em tiroteio com a polícia, queimou 34 coletivos da Viação Urubupungá, em Osasco, na Grande São Paulo. Também, que nome! Diz a internet que, em guarani, urubu quer dizer urubu mesmo, enquanto pungá é cocô de urubu, mas a mesma internet, tentando melhorar a coisa, informa que o nome significa grasnar de urubu.

Palavra-ônibus, sabemos todos, é palavra, quase sempre de uso coloquial, cujas acepções são tantas que não comportam delimitação semântica formal. Exemplos: troço, legal, bacana e, agora, suspeito. Às sete e cinco da matina a repórter de poderosa rádio belo-horizontina levou ao ar, gravada, sua entrevista em Ibirité com um “suspeito” de estuprar a filha nos últimos oito anos, menina que teve um filho aos 13 anos e se queixou às coleguinhas da escola de não aguentar as investidas de seu pai, também avô e pai de seu filhinho.

A repórter não disse o nome do estuprador e a entrevista começou com a pergunta: “Há quanto tempo o senhor vem estuprando sua filha?”. Resposta do suspeito: “Uns oito anos”. E o pior é que a burrice é contagiosa. Se a maior rede de rádios de Minas, empresa lucrativa, não coíbe a besteira, dá para entender que os jornalistas das pequenas rádios estaduais façam tudo para imitar a líder sediada na capital.

Ignácio de Loyola Brandão escreveu deliciosa crônica baseado em notícia publicada na edição de fevereiro do ótimo jornal O Trem Itabirano. Nela, o jornalista Marcos Caldeira Mendonça, maquinista-editor do Trem, fala de um programa matinal: “/.../ numa dessas incríveis rádios itabiranas. Apresentador no estúdio: E agora, de algum lugar da cidade, nosso repórter trazendo notícias importantes para nossos ouvintes. Entra o repórter: “Me encontro agora nas imediações do distrito industrial, mais precisamente num matagal na entrada para o distrito, onde, neste exato momento, visualizo nada mais nada menos que seis cavalos pastando em atitude suspeita”.

Pois é: até os cavalos deram para pastar em atitude suspeita. Ignácio, excelente cronista nascido em Araraquara (SP), vibrou: “Tenho 77 anos, vivi 60 deles no jornalismo, convivi com tudo, mas jamais tinha visto cavalos pastando em atitude suspeita”.

O mundo é uma bola

23 de maio de 1179: o papa Alexandre III emite a bula Manifestis Probatum, em que reconhece Portugal como reino independente. Nascido Rolando Bandinelli (1100-1181), Alexandre III foi papa de 1159 até morrer.

Em 1430, Joana d’Arc é capturada pelos bolonheses e entregue aos ingleses.

Em 1498, Girolamo Savonarola é condenado e churrasqueado em Florença, Itália, por ordem do papa Alexandre VI. Releva notar que Savonarola (1452-1498) não era um black bloc, mas um padre dominicano, intelectual talentoso que em 1474 se deixou tocar por um sermão e resolveu renunciar ao mundo incorporando-se à ordem dominicana de Bolonha sem o conhecimento de seus pais. Ferrou-se, tadinho, ao atacar em seus sermões os crimes do Vaticano. Parece que foi enforcado em vez de queimado, mas pouco importa: mata do mesmo jeito. Narigudo, o papa Alexandre VI, nascido na Espanha, teve uma porção de amantes, com destaque para Vanozza Catanei e Giulia Farnese, mulher de Orsino Orsini Migliorati. Consta que Giulia era muito bonita.

Hoje é o Dia Mundial da Tartaruga.

 Ruminanças

“A abelha atarefada não tem tempo para tristeza” (Blake, 1757-1827).

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